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A. Tempo comum para viver um mistério (sempre) incomum
No Tempo Comum, continuamos a celebrar o Mistério sempre Incomum: o mistério de Deus que Se fez homem em Jesus Cristo para nos salvar. O incomum torna-se, portanto, comum, não no sentido de vulgar, mas no sentido de constante. O Tempo Comum é também, por sua própria natureza, um tempo comunitário, ou seja, um tempo para, em comunidade, celebrar e testemunhar o Evangelho de Jesus.
Não foi em vão que Johannes Moller considerava a Igreja como «a Encarnação permanente». Na verdade, o Filho de Deus que encarnou em Jesus Cristo continua a encarnar no Seu corpo que é a Igreja, à qual pertencemos a partir do Baptismo.
B. Uma síntese e uma abertura
3. Na Liturgia, o Tempo Comum é o tempo mais longo. É composto por 33 ou 34 semanas, distribuídas em duas etapas: a primeira decorre entre a Festa do Baptismo do Senhor e o início da Quaresma e a segunda vai da segunda-feira após o Pentecostes até ao começo do Advento.
É no Tempo Comum que acompanhamos a maior parte da missão de Jesus. No Tempo Comum, não celebramos nenhum aspecto particular do mistério de Cristo, mas o mistério de Cristo na sua globalidade. No Tempo Comum, acompanhamos a vida pública de Cristo: desde o Seu Baptismo até à Sua Paixão, Morte e Ressurreição.
No Natal, vemo-Lo ao colo da Mãe; no Baptismo, acompanhamo-Lo a ouvir a voz do Pai. É por isso que, já no século V, S. Máximo de Turim considerava que «não é sem razão que celebramos esta festa pouco depois do dia do Natal» e que «também ela deve chamar-se festa de Natal». É que se, «no Natal, Cristo nasceu da Virgem, hoje é gerado pelos sinais do Céu». No Natal — prossegue S. Máximo —, «Maria, Mãe de Jesus, acaricia-O no Seu colo; agora, ao ser gerado entre os sinais celestes, Deus, Seu Pai, envolve-O com a Sua voz, dizendo: “Este é o Meu Filho amado, no qual Eu pus todo o Meu enlevo. Escutai-O”(Mt 17,5). A Mãe apresenta-O aos magos para que O adorem, o Pai apresenta-O às nações para que O reverenciem».
C. Uma teofania e uma antropofania
5. O Baptismo de Jesus constitui uma Teofania e uma Antropofania. Jesus é o Filho de Deus (cf. Mc 1, 11) em forma humana. Ele é a revelação definitiva de Deus e é a revelação suprema do homem. O Concílio Vaticano II proclama que Jesus, Verbo encarnado, «revela o homem ao homem». O serviço é a chave desta dupla revelação. O Filho de Deus é já delineado por Isaías como o servo (cf. Is 42, 1): Servo de Deus e Servidor para os homens.
No Baptismo, Deus ungiu Jesus com «Espírito Santo e fortaleza»(Act 10, 38) para a Sua missão messiânica que, como refere a Primeira Leitura, consiste em levar «a justiça às nações», em «abrir os olhos aos cegos», em «tirar da prisão os cativos e da cadeia os que habitam nas trevas»(Is 42, 1-4.6-7). Jesus apresenta-Se, assim, inteiramente divino e inteiramente humano: consubstancial ao Pai na divindade e consubstancial a nós na humanidade.
Está, assim, apontada a nossa identidade e traçado o nosso itinerário. Ser cristão é seguir Cristo, é ser baptizado em Cristo. Por tal motivo, terminamos o Tempo de Natal com o Baptismode Cristo e iniciamos o Tempo Comum com a determinação de vivermos sempre o nosso Baptismo em Cristo.
D. Baptizar significa mergulhar
7. O Baptismo não pode ser remetido ao estatuto de episódio da nossa infância mais remota. O Baptismo imprime carácter, afecta todo o nosso ser. É por tal motivo que se trata de um sacramento que não é reiterado: recebido uma vez, recebido para sempre. As consequências do Baptismo não podem ser reduzidas a uma festa, aos filmes e às fotos. A grande consequência do Baptismo é a vida de Cristo em nós.
Etimologicamente, «baptizar» significa «mergulhar». Pelo que baptizar significa mergulhar em Cristo e, por Cristo, no Pai na força do Espírito Santo. Por outras palavras, baptizar significa mergulhar na vida divina, na vida da Santíssima Trindade. Foi uma das incumbências que o Ressuscitado deixou à Igreja: baptizar «em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo»(Mt 28, 19).
As águas do Baptismo representam — isto é, tornam presente — o mistério pascal de Jesus. Foi na Páscoa — na Paixão, na Morte e na Ressurreição — que Jesus nos salvou do pecado e nos garantiu a dignidade de filhos de Deus. No Baptismo, descemos com Cristo à morte e com Cristo subimos à vida. Por isso, a celebração do Baptismo, durante muitos anos, era sempre na Vigília Pascal. Sto. Agostinho, por exemplo, conta-nos a sua experiência baptismal da noite de 24 para 25 de Abril do ano 387.
E. Um sacramento que tem princípio, mas não tem fim
9. Não sendo obrigatório que o Baptismo seja na Páscoa anual, é de todo recomendável que ele ocorra na Páscoa semanal, ou seja, ao Domingo. Uma vez que é ao Domingo que a Igreja se reúne para celebrar a Ressurreição do Senhor, faz todo o sentido que seja nesse dia que se acolham os novos membros da mesma Igreja. Importa ter presente que o Baptismo tem, a par da sua dimensão cristológica, uma irrenunciável dimensão eclesiológica. Sendo a Igreja o novo Corpo de Cristo, pertencer a Cristo equivale a pertencer à Igreja. É por isso que o Baptismo não deveria ser nunca uma festa apenas da família da criança, mas a festa de todos os membros da Igreja.
Pelo Baptismo, não pertencemos somente à nossa família de sangue. Passamos a pertencer igualmente à numerosa família dos filhos de Deus. No Baptismo, toda a comunidade cristã acolhe com alegria o seu novo membro. Neste contexto, os padrinhos são os representantes da comunidade cristã para ajudar os pais na educação cristã. Os padrinhos não são somente aqueles que dão prendas; são sobretudo aqueles que testemunham a vida cristã. É por isso que os padrinhos devem ser cristãos com maturidade, já com o sacramento do Crisma e da Eucaristia e com uma vida consentânea com a fé e a missão que vão desempenhar. Se os padrinhos não são cristãos praticantes como podem ajudar a criança baptizada na prática da fé cristã?
Tal como festejamos o dia do nosso nascimento, seria bom que festejássemos o dia do nosso novo nascimento, no Baptismo. Cada dia de um baptizado deve ser um dia baptismal, marcado pela presença de Cristo em nós e de nós em Cristo. Cristo vive sempre de frente para nós. Não queiramos viver de costas para Cristo. Cristo permanece sempre em nós. Procuremos permanecer nós também em Cristo. Assim sendo, no Tempo Comum, havemos de ter uma vida incomum, uma vida fora do comum, enfim uma vida bela e luminosa.