No ano passado havia – segundo dados das forças de segurança – cerca de dezasseis mil velhos, em Portugal, a viver sozinhos ou isolados. Embora estejam, por estes dias, a ser atualizados os dados, através da ‘Operação censos sénior’, poderemos tentar encontrar algumas das causas deste fenómeno de ‘abandono’ dos nossos mais velhos, queremos sugerir breves desafios...
Recorrendo, novamente, aos dados publicados, os distritos onde há mais velhos sós ou abandonados são: Santarém, Porto, Castelo Branco, Braga, Bragança, Vila Real e Aveiro... com mais de mil velhos em situação de abandono total ou parcial, em cada um dos distritos. Por seu turno, a ilha do Corvo, nos Açores, é o distrito onde este fenómeno tem menor expressão, somente catorze!
Quais são as causas mais profundas para que os mais velhos sejam, deste modo, abandonados e/ou neglicenciados? Com que fatores (internos, exteriores, culturais ou mesmo espirituais) temos de contar para tentarmos explicar o agravamento deste abandono? Será isto resultado de um estilo de vida ou de uma vida sem estilo humano? Como podem ter contribuído os mais velhos para que este fenómeno se tenha generalizado? Como serão tratados os filhos que assim abandonam os pais? Serão os (ditos) cristãos diferentes no seu comportamento?
Estas e muitas outras perguntas nos assaltam ao vermos o tratamento dado a tantos dos nossos mais velhos, andando em busca de propostas que possam atenuar esta chaga da nossa sociedade, cada vez mais materialista. Por isso, a proposta que apresentamos tem tanto de simples quanto de circunstancial, pois, tendo nós a responsabilidade – em razão do ofício e do ministério – dum lar de idosos e, conjuntamente, de um jardim-de-infância, queremos tão simplesmente deixar pistas neste ‘ano europeu do envelhecimento ativo e da solidariedade entre gerações’.
= Diálogo entre crianças e velhos: lições e projetos
Certamente já teremos visto um avô ou uma avó em conversa um neto ou uma neta ou vice-versa. O momento é ainda mais enternecedor quando o mais novo é muito pequeno, pois a distância física – pelo tamanho, pela diferença e até pel linguagem – se atenua nas condições psicológicas.
Quando assistimos à saída das crianças do jardim de infância e são os avós quem os procura podemos viver toda uma ressonância de mensagens mais ou menos perceptíveis... entre comunhões de sangue.
Sabemos como hoje muitas das nossas crianças são – agradavelmente – a companhia para os seus avós e estes sentem-se úteis pela ajuda que prestam a seus filhos/as... pais. Felizmente nem distinguimos a atitude de avô ou de avó... ambos sentem-se colaboradores nas dificuldades. Vivendo nesta sintonia vamos humanizando as relações entre gerações... onde os pais correm o risco de serem menos interventivos e até participantes no processo de educação.
= Crianças apadrinham/amadrinham... os mais velhos
Partindo das respostas sociais dos nossos centros paroquiais poderemos criar sinergias entre estas duas etapas do desenvolvimento humano: as crianças (tanto da creche como do jardim-de-infância ou mesmo do centro de atividades de tempos livres) poderiam assumir algum cuidado para com os mais velhos... muitos deles acima dos oitenta anos e, por isso, no estádio de ‘grandes velhos’, quais bisavós ou tetravós sociais e espirituais.
Se cada sala assumisse o cuidado de um certo número – entre seis e oito, num leque de vinte e cinco crianças – de velhos do lar ou de centro de dia poderíamos ir humanizando as nossas respostas sociais, envolvendo nessa aproximação os pais e outros participantes no processo educativo, bem como gerando proximidade e tempo de escuta para com muitos dos nossos velhos, que se vão fechando no seu mundo ou até são relegados para o limbo do esquecimento... mesmo que estejam com outros ao seu lado.
Numa espécie de contestação às vozes agoirentas que semeiam sinais da desgraça e do desespero, queremos lançar pétalas de boa harmonia entre os mais novos e mais velhos, tentando fazer com que adolescentes, jovens e adultos façam parte da solução positiva entre o berço e a bengala, aconchegando uns e amparando outros... terna e fraternamente.
Luz de serenidade e de ousadia a quanto obrigas... sempre em fidelidade ao Espírito de Deus em cada tempo e nos mais diversos lugares!
António Sílvio Couto
(asilviocouto@gmail.com)
ECCLESIA