«...decidi convocar um especial “Ano da Fé", que começará em 11 de outubro de 2012 – 50º aniversário da abertura do Concílio Ecumênico Vaticano II – e terminará em 24 de novembro de 2013, solenidade de Cristo Rei do universo. As motivações, as finalidades e as linhas diretivas deste Ano foram expostas em uma carta apostólica que será publicada nos próximos dias. O Servo de Deus Paulo VI convocou um análogo “Ano da Fé” em 1967, por ocasião do 19º centenário do martírio os apóstolos Pedro e Paulo, durante um período de grandes mudanças culturais. Considero que, transcorrido meio século da abertura do concílio, ligada à feliz memória do Beato João XXIII, seja oportuno recordar a beleza e a centralidade da fé, a exigência de reforçá-la e aprofundar nela no âmbito pessoal e comunitário, e fazê-lo em perspectiva não tanto celebrativa, mas sim missionária, na perspectiva, justamente, da missão ad gentes e da nova evangelização.» Bento XVI, Angelus 16.10.2011)
Uma infância difícil, um cancro que matou a sua esposa... diz que não foi a terapia, mas a oração o que o ajudou, e anima os irlandeses a superarem a crise de fé.
Pierce Brosnan, em plena crise da Igreja irlandesa mesmo depois de se conhecerem os detalhados informes sobre casos de abusos físicos e sexuais, não teve dificuldade em falar da sua fé católica numa entrevista à Rádio Televisão de Eire.
"A oração ajudou-me a superar a morte da minha esposa por causa de um cancro, e de um filho que caiu numa época dura. Ele próprio reconhece, em várias ocasiões que a terapia não o ajudou a superar a dor... "por fim, tu és o teu próprio psicólogo". Porém, a oração era uma consolação forte. "Tinha as orações católicas tradicionais, mas também o meu diálogo pessoal com O de Cima". Agora a fé ajuda-me a ser um pai, um actor e um homem".
"Sempre ajuda um pouco ter oração no teu bolso. No fim, terás algo, e para mim isso é Deus, Jesus, a minha educação católica, a minha fé", acrescenta.
"Deus foi bom comigo. A minha fé foi boa para mim, nos momentos de profundo sofrimento, duvida e fé. É uma constante, a linguagem da oração. Para além disso, Brosnan acredita que a fé ajudará os irlandeses a superar a crise económica.
Apesar de ter uma relação conflituosa com a Igreja, Brosnan assegurou em várias ocasiões que nunca deixou de ir à missa nem de rezar.
«É interessante ver que Jesus, perante a sexualidade, mesmo confrontado com desvios, é tolerante e perdoa. A Igreja parece ter posto o acento no sexo e nos seus desvios, mas Jesus o que condenou de forma veemente foi fundamentalmente a ganância, a avareza, a opressão: "Não podeis servir a Deus e ao dinheiro." É necessário distinguir entre a Bíblia, onde se encontra um dos livros mais exaltantes do amor erótico, que é o Cântico dos Cânticos, e, depois, o mal-estar do cristianismo histórico em relação à sexualidade, que provém fundamentalmente dos gnósticos e de Santo Agostinho. Santo Agostinho é herdeiro de uma escola gnóstica, que é o maniqueísmo, que leva a gnose à radicalidade.
Então, Santo Agostinho trouxe também problemas...
Ele é um génio, mas trouxe ao Ocidente e ao cristianismo histórico verdadeiras tragédias do ponto de vista sexual. Ele era maniqueu e, a partir do maniqueísmo, tinha resolvido o problema do mal: há dois princípios, um do bem e outro do mal. Há uma questão que se coloca sobretudo aos crentes: se Deus é infinitamente bom e omnipotente, como se explica o mal? Através do maniqueísmo, ele tinha resolvido o problema. Mas, uma vez convertido, precisa de encontrar uma solução, pois o cristianismo diz que Deus, quando olhou para o mundo, viu que tudo era bom. Donde vem então o mal? Quando se converte ao cristianismo, Santo Agostinho tem de encontrar a origem do mal. Vai à Carta aos Romanos, de São Paulo, e lê: "Adão, no qual todos pecaram." Mas o grego (ele só conhecia o latim) diz: "Porque todos pecaram." Uma coisa é Adão ser o primeiro que peca, outra é dizer que, nele, todos pecaram. E de tal modo pecaram, que todos transportam esse pecado, que tem uma origem sexual e se transmite sexualmente. Este é o mal que vem ao Ocidente através da gnose, do maniqueísmo, de Santo Agostinho. Todos são concebidos em pecado e desse pecado original só o baptismo liberta. Assim, não hesitou em "enviar" para o Inferno as crianças não baptizadas, porque vinham com o pecado original»...
Num dos seus textos, diz que a Igreja perdeu a credibilidade em termos de doutrina sexual. É assim?
A sexualidade também tem a ver com o prazer e este confronta-se com o poder. Na medida em que a Igreja se tornou numa instituição de poder, tem muita dificuldade em lidar com o prazer e a autonomia. Não sabe, por isso, como lidar com a sexualidade, com as pessoas que estão no mundo de modo autónomo. Essa é uma das questões fundamentais da Igreja.
Por isso surgem as questões relativas ao planeamento familiar, aborto, eutanásia...
A Igreja lutou contra a modernidade, embora, por outro lado, os grandes valores da modernidade venham, fundamentalmente, da Bíblia. Não é por acaso que é no Ocidente que se dá a modernidade, a secularização, a separação da Igreja e do Estado, que tem a ver com a autonomia, os direitos humanos... São valores que vêm da Bíblia, mas que os iluministas tiveram de impor contra a Igreja oficial.
Há um Papa que proibiu a leitura da Bíblia, outro refere-se à "detestável doutrina" dos direitos humanos. No entanto, são valores que vêm fundamentalmente da Bíblia. Afirmam-se a partir da ideia de um Deus transcendente, que cria por amor, livremente. Se Deus cria livremente, só pode criar criaturas autónomas, homens e mulheres livres, e as realidades terrestres seguem as suas leis, sem precisarem da tutela da Igreja. Por outro lado, o cristianismo trouxe ao mundo a ideia da dignidade divina de todos os seres humanos, independentemente da cor, etnia, sexo, posição social, nacionalidade ou religião.
Anselmo Borges em entrevista à Pública (06.02.2011)
Os meios de comunicação preferem o grande espectáculo a esses exercícios de pensamento. O que encheu jornais e telejornais foi a resposta de Bento XVI à seguinte pergunta: Quer isso dizer que, em princípio, a Igreja Católica não é contra a utilização de preservativos? “É evidente que ela não a considera uma solução verdadeira e moral. Num ou noutro caso, embora seja utilizado para diminuir o risco de contágio, o preservativo pode ser um primeiro passo na direcção de uma sexualidade vivida de outro modo, mais humana”.
Já vários Bispos e Cardeais tinham dito isso e muito mais como, por exemplo, o Cardeal Martini: “devo confessar que a encíclica Humanae Vitae engendrou, infelizmente, uma evolução negativa. Muitas pessoas afastaram-se da Igreja e a Igreja afastou-se delas. Causou muitos estragos. Um período de 40 anos, como aquele que acabamos de viver – tão longo como a travessia do deserto por Israel – poderia permitir-nos um olhar novo sobre estas questões”. Não se referia só ao preservativo. Perguntar-se-á: porquê, agora e só agora – tendo Ratzinger responsabilidades nesse deserto –, Bento XVI decidiu falar?
Têm sido dadas várias explicações. A última é cronológica. A declaração sobre o preservativo, na sua viagem a África, provocou muita indignação. A pedofilia dos eclesiásticos deixou o pontificado deste Papa numa aflição martelada, durante anos, pelos grandes meios de comunicação. O Vaticano estava prisioneiro dos seus próprios erros. Esta declaração, para já, fez de Bento XVI o Papa da coragem.
Seja como for, este acontecimento revelou-se uma grande operação de markting e talvez dê, por algum tempo, sossego a um homem muito cansado. Dará, também, que pensar? Como foi possível, durante tanto tempo, eclipsar a investigação teológica sobre a Humanae Vitae, de Paulo VI (1968)? Como se deixou considerar definitiva uma decisão provisória? Qual foi a liberdade de debate deste tema, nos espaços eclesiais? Deverá ser excluído da ética sexual o diálogo activo entre fé e razão?
Mesmo nos temas que não eram considerados dogmas de fé nem palavra infalível dos Papas – creio que desde João XXIII nunca mais se ouviu falar de nenhuma – caiu-se na armadilha de considerar muitas declarações importantes, para a orientação pastoral da Igreja, como definitivas e irreformáveis. Não se conseguiu favorecer o aprofundamento de valores permanentes, através de expressões mutáveis da sensibilidade cultural e ética de cada geração. Para não se cair no relativismo, tornou-se absoluto o provisório, uma forma degradante de idolatria.
Sem o dizer, talvez nos encontremos perante o começo de uma grande mudança. A atitude do Papa deixou entender que nem tudo é definitivo.
Vamos entrar na celebração do Advento, preparando a festa da encarnação de Deus na historicidade humana. Ao falar em Advento, dizemos que há muita coisa que ainda está para vir. O próprio Deus vai vindo.
Os cristãos estão a celebrar o Advento, uma peregrinação à Fonte do Desprendimento, do despojamento absoluto, o Presépio, Kenôsis de Deus, segundo a narrativa de S. Lucas. Mais radical ainda é a voz do IV Evangelho: O Verbo fez-se carne, fragilidade humana, e na carne nos veio a graça e a verdade, graça sobre graça, do Deus que ninguém jamais viu. Dessa carne crucificada jorrou a fonte de sangue e água sobre o mundo.
Alguns Evangelhos Apócrifos deram largas à imaginação para encher de fantasia o despojamento do Presépio. Com o advento da modernidade, época do desencantamento do mundo, os historiadores resolveram acabar de vez com delírios angélicos, rusticidades pastoris, festas lunares, repetindo com ar triunfante: Jesus não nasceu a 25 de Dezembro, não foi dado à luz numa gruta, não havia burro ou vaca a assistir, os magos não eram reis nem eram três, não houve pastores a adorá-lo nem anjos a cantar, não fugiu para o Egipto. Vendo bem as coisas, acabaram por colocar o Menino Jesus, Nossa Senhora e S. José no mundo dos sem abrigo. Por portas travessas, reencontraram as narrativas do Presépio.
Francisco de Assis, o ecologista medieval, foi à Fonte e construiu a miniatura de um mundo reencantado, um sonho de reconciliação universal. João Paulo II, para derrubar muros entre as religiões e encontrar uma fonte divina para a paz do mundo, chamou-as todas a encontrar o espírito de Assis, o espírito da paz.
Com este Domingo começa a segunda etapa da peregrinação ao Presépio, ao lugar dos sonhos. Quem tiver uma Bíblia à mão vá ler os versículos 1 a 10 do capítulo onze de Isaías. Deixo, aqui, apenas um fragmento: (…) O lobo viverá com o cordeiro e a pantera dormirá com o cabrito; o bezerro e o leãozinho andarão juntos e um menino os poderá conduzir. A vitela e a ursa pastarão juntas, as suas crias dormirão lado a lado; o leão comerá feno como o boi. A criança de leite brincará junto ao ninho da cobra e o menino meterá a mão na toca da víbora. Não mais praticarão o mal nem a destruição em todo o meu santo monte: o conhecimento do Senhor encherá o país como as águas enchem o leito do mar.
Quem quiser fazer uma peregrinação à sua vida interior encontrará, como diz S. João da Cruz num poema imortal, “A fonte que mana e corre,/ Embora seja noite./ Aquela eterna fonte não a vê ninguém/ E bem sei onde é e donde vem,/ Embora seja noite”. No desprendimento, na frugalidade, na sobriedade, encontrará uma fonte de partilha com todos os aflitos. A peregrinação à fonte, em Gandhi, em Lanza del Vasto, em Francisco de Assis, em todos os místicos é uma peregrinação de desprendimento e de iluminação interior. Sem ela andamos com os sonhos trocados. Queremos a salvação naquilo que nos perde de nós, dos outros, da natureza e de Deus.
Os católicos em Portugal de 2010 sabem que por mais ninguém fariam uma festa tão solene
Mergulhada num vale embebido de verde, a aldeia das Furnas, nos Açores, é certamente uma das mais belas do mundo. Com o vulcão acordado dia e noite, anos a fio, águas quentes, frias e mornas, fontes abundantes e humildes, um lago sereníssimo a espelhar os cambiantes do céu, a embriaguês das flores na sua variedade estonteante, tudo num singular enquadramento de montanhas, outros tantos miradouros geradores de silêncio respeitoso e prolongado com olhares pasmados. O vale das Furnas tantas vezes descrito por tantos escritores portugueses e estrangeiros.
Todos os anos, a seguir à Páscoa, acontece uma procissão peculiar. A procissão dos enfermos. O Santís-simo percorre as ruas e visita as casas dos doentes que O não puderam receber. Mas nessa viagem há uma particularidade: um longo tapete das melhores flores e ramagens das Furnas, artisticamente colocadas em “formas” numa harmonia esplendorosa de cores. As pessoas dizem apenas: “É O Senhor que vai passar aqui. Ele merece o melhor”. De todas as festas da terra é a que tem menos ruído e dispersão. E o que se percebe é que aquele monumento de beleza não é um gesto de vaidade mas de amor pelo Senhor que passa.
Pedro, na pessoa do Papa, vem visitar-nos. A notícia anda por aí entre polémicas e afirmações de fé: há quem pense que há flores a mais, excesso de tempo, perda de rentabilidade, gastos excessivos em decorações, peregrinações e encontros que podem ser mais exibição que devoção.
Será para muitos, um alemão, um antigo prefeito, um líder, um chefe de Estado. Mas sabemos quem nos visita. Habituámo-nos, ao longo de milénios, a olhá-lo para além da humanidade, para o que ele significa, transporta e projecta nas nossas comunidades: continuidade apostólica, unidade da fé, elemento congregador da ecclesia, comunidade cristã. E assim como o povo das Furnas diz que por mais ninguém era capaz de estender um tapete de flores, também os católicos em Portugal de 2010 sabem que por mais ninguém fariam uma festa tão solene. É Pedro que nos visita.