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PREPAREMOS A NOSSA VIDA PARA A SUA VINDA! (Segundo Domingo do Advento)

por Zulmiro Sarmento, em 07.12.15
 

A. Preparar: a palavra-chave e a atitude decisiva

  1. A palavra-chave deste segundo Domingo do Advento é preparar. Mas preparar não é só a palavra-chave. É também a atitude decisiva. Estamos, com efeito, num tempo que não costuma ser muito complacente diante dos improvisos, isto é, diante da falta de preparação. E, se repararmos, nós costumamos preparar — e preparar bem — o que consideramos importante. Preparamos os testes, preparamos os discursos, preparamos as refeições, etc.

Nesta altura, já andamos seguramente envolvidos com os preparativos para o Natal. Andamos a preparar a consoada e a preparar os presentes. E é assim que, aos olhos de muitos, se prepara o Natal. Não digo que o Natal não passe por aqui, mas será que o Natal é só isto? Será que o Natal é sobretudo isto? Será que a preparação para o Natal é sobretudo esta?

 

  1. S. João Baptista usa, enfaticamente, a linguagem da preparação. Ele recorre ao imperativo, ordenando que nos preparemos para a vinda do Senhor e que, sobretudo, preparemos o caminho do Senhor: «Preparai o caminho do Senhor»(Lc 3, 4).

Preparemos, sem demora, o caminho do Senhor. Preparemos, sem demora, os nossos caminhos para o Senhor. O caminho que o Senhor quer trilhar é a nossa vida, é o nosso ser, é o nosso quotidiano. Será que os nossos caminhos estão preparados? Será que os nossos caminhos estão limpos? Será que, pelo menos, os nossos caminhos estão abertos?

 

B. Tanta coisa para «deletar»

 

3. Há tantos caminhos tapados na vida. Há tantos caminhos preenchidos na vida: preenchidos com quase tudo, menos com Deus. Há tantos caminhos cheios de nada, embora preenchidos com quase tudo. Só que este «quase tudo» sabe a pouco e, quase sempre, apenas a egoísmo e a interesses pessoais.

Precisamos, por isso, de varrer os nossos caminhos e de «deletar» tanta coisa acessória, tanta coisa superficial, tanta coisa banal. Se estivermos atentos, daremos conta de que essencializamos o que é relativo e relativizamos o que é essencial. Há muito desperdício de tempo, há muito desperdício de energia, há muito desperdício de vontade. Por conseguinte, é tempo de reaproveitar o tempo. É tempo de reaprender a caminhar no tempo. Em suma, é tempo de voltar a ouvir o apelo de S. João Baptista: «Preparai o caminho do Senhor». Nunca deixemos de preparar os caminhos do Senhor, os caminhos que o Senhor quer fazer connosco.

 

  1. Haverá lugar para Deus nos nossos caminhos até ao Natal? Ele caminha sempre connosco. Será que nós queremos caminhar com Ele? Jesus quer ser Emanuel. Será que nós deixamos que Ele seja Emanuel? Será que estamos dispostos a que Ele seja Deus connosco, Deus em nós?

Sim, preparar o Natal é preparar a nossa casa para receber os nossos familiares. Mas não será, muito mais, preparar a nossa vida para acolher Jesus inclusivamente na pessoa dos nossos familiares? Sim, preparar o Natal é fazer um presépio. Mas não será, muito mais, preparar a nossa vida para ser, ela própria, um presépio vivo

 

C.  Um novo lugar para Jesus: a nossa vida

 

5. O lugar onde Jesus quer (re)nascer, hoje, não é já a manjedoura de Belém. O lugar onde Jesus quer (re)nascer, hoje, é o nosso ser, a nossa vida, a vida da humanidade inteira. Estaremos a preparar devidamente a nossa vida para a vinda de Jesus?

Jesus não veio — nem vem — para que tudo continue na mesma. Jesus veio — e vem — para que tudo seja diferente, para que tudo seja melhor. Não é só o mundo que é feito de mudança, como lembrava Luís de Camões. Todo o Evangelho é, do princípio ao fim, um permanente convite à mudança. Logo no início da missão, Jesus convoca: «Arrependei-vos»(Mc 1, 15). Ou seja, «mudai de vida», «mudai a vida»!

 

  1. Esta mudança tem o nome de conversão e passa por gestos concretos. Passa, antes de mais, por uma conversão a Cristo. Passa, portanto, pela confissão do nosso pecado e pela disponibilidade para uma vida nova. De resto, é bom não esquecer que, antes de nos convertermos a Cristo, já Cristo Se converteu a nós. Cristo fez-Se o que nós somos. Será que estamos dispostos a fazermo-nos o que Ele é?

A mudança passa também pela sobriedade, pela humildade, pelo reencontro com a beleza das coisas simples. Na verdade, não há nada mais longe de Cristo do que celebrar o Seu nascimento com a ostentação e o exibicionismo. Não deixemos, pois, que o Natal se reduza a um «vendaval de consumo» sem freio. Deixemo-nos reencantar pelo Natal. Deixemo-nos envolver pelo seu espírito e cativar pela sua candura.

 

D. A nossa missão «ecóica»

 

7. Neste sentido, procuremos «endireitar» o que está «torto» (cf. Lc 3, 4-5). Há, sem dúvida, tantos caminhos tortos e tantas atitudes tortuosas nos nossos caminhos. Comecemos por ouvir a voz de João. Não consintamos que essa voz se dilua no deserto da nossa indiferença (cf. Lc 3, 4). Só que essa voz nunca deixará de bradar, nunca deixará de inquietar os nossos ouvidos (aparentemente) aquietados.

Procuremos ouvir a voz que se faz eco da Palavra. João é a voz da Palavra que é Jesus. É uma voz fiel que faz ressoar, fidedignamente, a Palavra. Quanto mais perto estiver da Palavra, tanto mais nítida será a voz.

 

  1. A nossa missão na Igreja há-de ser a «missão ecóica», é a missão de ser eco. Foi, aliás, o que Jesus pediu quando incumbiu os discípulos de levarem o Evangelho a toda a parte e a toda a gente (cf. Mc 16, 15; Mt 28, 20). Quem os ouvisse, a eles, haveria de O ouvir sempre, a Ele (cf. Lc 10, 10). Aliás, essa preocupação era muito vincada nos começos. A Igreja não anunciava as palavras que usava. O seu compromisso era ser o eco da Palavra recebida. Foi este compromisso que levou os apóstolos a nunca calar o que tinham ouvido (cf. Act 4, 20).

Mais do que criadora de palavras, a Igreja sempre se viu a si mesma como uma criação da Palavra («creatura Verbi»). Por isso, quanto mais perto estivermos da Palavra, mais audível será a Palavra e mais transparentes seremos nós. Reconheçamos, porém, que nem sempre é isso o que acontece. Há palavras que se interpõem diante da Palavra e que chegam a perturbar a escuta da Palavra. Em vez de serem eco da Palavra, não passam de ruído que mal deixam acolher a Palavra. Assim sendo, o importante é que a Palavra viva em cada pessoa e que cada pessoa procure viver de acordo com a Palavra. Uma «Igreja ecóica» é chamada a oferecer a Palavra que lhe é, continuamente, oferecida. Se possível, sem glosas. E sem filtros.

 

E. É urgente «aplanar» o que (ainda) está «torto»

 

9. Aproveitemos este tempo para ler e para meditar a Palavra. Como João Baptista, procuremos ser voz da Palavra. A Palavra de Deus chegará aonde nós chegarmos. Anunciemos a Palavra de Deus com os lábios e nunca nos cansemos de testemunhar a Palavra de Deus com a vida.

Levemos a Palavra de Deus aos «lugares tortuosos»(Lc 3, 5) e que se tornam quase intransitáveis. Que esses lugares possam ser frequentáveis e que os nossos caminhos se tornem planos, sem curvas. Na nossa vida, ainda há muitas curvas fechadas e apertadas, que não deixam (ante)ver com nitidez o caminho. Procuremos caminhar em linha recta e não às curvas. Quem é recto torna-se (saudavelmente) previsível, ainda que sempre receptivo às imprevisíveis surpresas de Deus.

 

  1. Não nos cansemos de «aplanar» o que ainda está «torto» e «tortuoso». Deixemos que, através do nosso testemunho, os outros possam «ver a salvação de Deus»(Lc 3, 6).

Este Domingo e o próximo são dominados pelo grande «preparador» do Natal. S. João Baptista é o «preparador» dos caminhos que Deus quer pisar. Ele prepara pela palavra e pelo exemplo. Em S. João Baptista, não há «curto-circuitos» entre a palavra e a vida. Aliás, em S. João Baptista, nenhum circuito é curto. O «circuito» entre a sua palavra e a sua vida é longo e leva-nos longe. Leva-nos sempre a Jesus!

Do blogue THEOSFERA

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