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MISSIONÁRIOS, NÃO DEMISSIONÁRIOS! (29º Domingo do Tempo Comum)

por Zulmiro Sarmento, em 18.10.15
 

  A. A fé mexe com tudo, até com o bolso

  1. Chegados, uma vez mais, ao Dia Mundial das Missões, era bom que não reduzíssemos tudo a uma esmola. A partilha de dinheiro é necessária, mas a entrega da vida é muito mais urgente. Aliás, a partilha de dinheiro deve ser sempre inserida no âmbito da entrega da nossa vida. Afinal, se a fé mexe com tudo, é natural que mexa também no nosso bolso. Uma fé que não nos entrasse no bolso seria autêntica fé?

A fé é, por natureza, invasiva e incendiária. Ela pretende invadir todas as dimensões do nosso ser e incendiar todos os momentos da nossa vida. A fé não admite poupanças. A fé implica gastos. A fé exige que nos gastemos até ao último dia, até à derradeira gota do nosso suor.

 

  1. Assim sendo, a primeira coisa que temos de assumir é a própria missão. Nós não somos apenas destinatários, temos de ser também agentes. Quem é tocado por Cristo é chamado, nesse mesmo instante, a tornar-se anunciador de Cristo.

A missão é para todos: para todas as pessoas, para todos os lugares e para todos os momentos. A missão não é só para os missionários até porque missionários temos de ser todos, em toda a parte. Quem não faz missão será cristão? Não. Quem não faz missão não é cristão.

 

B. Há que criar uma «cultura de missão», não de demissão

 

3. Hoje é, por isso, (mais) uma oportunidade para tomarmos consciência do que somos. Hoje é, por isso, (mais) uma oportunidade para percebermos que ser cristão é ser missionário. Neste sentido, há que compreender que a oração tem de desaguar na acção. E, concretamente, há que ter presente que a Missa é o começo — e o alimento — da Missão.

Qual é o campo da missão? É o campo da nossa vida. Onde está o cristão, aí tem de estar o missionário. Em casa e na rua, no trabalho e no lazer, nada pode ficar à margem da missão. Quem nega que é preciso levar o Evangelho às famílias, ao trabalho, à política, à cultura e ao desporto? A resposta pode não vir de todos, mas a proposta não pode deixar de chegar a todos.

 

  1. Por conseguinte, é vital criar uma «cultura de missão», pelo que é fundamental vencer — definitivamente — uma «cultura de demissão», que teima em persistir, em tolher-nos. Infelizmente, ainda subsiste uma instintiva tendência para uma certa «demissão».

Até sabemos o que deve ser feito, mas facilmente nos tranquilizamos sob o pretexto de que não é para nós, de que não temos tempo ou capacidade. Sobretudo quando se trata de uma missão mais delicada, em que o anúncio pode incomodar ou até ferir, multiplicam-se as escusas e os recuos. De facto, há quem saiba o que outros devem fazer, esquecendo que o importante é que cada um faça o que deve não se recusando a fazer o que pode. Em tudo — e sempre —, a missão, não a demissão! Jesus quer que sejamos missionários, não demissionários!

 

C. Até as redes sociais podem ser (fecundas) redes missionárias

 

5. Não nos esqueçamos de uma coisa: onde abundam as adversidades, aumentam também as possibilidades. Vamos deixar de fazer missão só porque o ambiente é adverso? É preciso estar onde as pessoas estão. E se há problemas, também há-de haver uma forma de lidar com os problemas.

É sabido que, hoje em dia — e em noite! —, as pessoas estão nas redes sociais. Será legítimo subestimar ou abandonar este novo mundo, ainda por cima tão densamente povoado? Tanta gente que por ali passa! Como não apresentar aí o Deus que nos enlaça, o Deus que sempre nos abraça? Estes novos meios também podem ser vistos como «novos púlpitos». Além do mais, eles podem ensinar-nos a importância de trabalhar em rede, interagindo com quem questiona, com quem inquieta, com quem procura.

 

  1. As redes sociais podem ser também estimulantes redes missionárias tornando-se fecundas redes de evangelização. O importante é entender que estas redes nos ajudam a chegar (muito) mais além das redes. Há muitas aproximações — ou reaproximações — à fé que começam pelas redes sociais e prosseguem fora das redes sociais: no confessionário, na Eucaristia, num compromisso global com o Evangelho.

É por isso que, concretamente em relação ao «facebook», diria: «nem sempre nem nunca». Tão perigoso é nunca estar no «facebook» como estar sempre no «facebook». O importante é saber estar no «facebook» como se deve saber estar na vida: com critério, com equilíbrio e sobretudo com sentido de missão e não apenas diversão.

 

D. O missionário ao serviço do Missionante

 

7. Habitualmente, pensamos nos destinatários e nos espaços da missão. Não basta, porém. É prioritário que pensemos sempre no conteúdo da missão. Ou seja, é importante pensar naqueles a quem levamos a missão, mas é decisivo pensar, antes de mais, n’Aquele que levamos na missão.

A missão não pode ficar à porta nem contentar-se com o limiar. É preciso sair para convidar outros a entrar. Há que não ter medo de falar de Jesus Cristo. A missão consiste em levar Jesus Cristo: em forma de Palavra, em forma de Pão, em forma de Caridade e Solidariedade, em forma de Justiça, em forma de Ternura e Amor.

 

  1. Neste Domingo, Jesus convida-nos a despojarmo-nos de nós. Afinal, na missão não vamos pregar-nos a nós mesmos. O centro da missão não é o missionário, é o Missionante; não é o enviado, é o Enviante. Parafraseando S. Paulo, diria que não nos pregamos a nós, pregamos a Jesus Cristo que vive em nós (cf. Gál 2, 20).

Na missão, não pode haver jogos de ambição nem sonhos de poder. Essa foi a tentação dos missionários da primeira hora e acaba por ser a tentação dos missionários desta nossa hora. Daí a pertinência da advertência de Cristo. Na missão não se está pelo poder, mas pelo serviço. Ser missionário não é ser proprietário, é ser servo, é querer ser servidor. Tal foi, de resto, o testemunho do próprio Jesus Cristo, «que não veio para ser servido, mas para servir e dar a vida»(Mc 10, 45).

 

E. Uma vida «centrifugada» e não «centripetada»

 

9. É por isso que Jesus é apresentado como sacerdote e até como «sumo sacerdote»(Heb 4, 14). Ele não oferece coisas exteriores, oferece-Se a Si mesmo, oferece a própria vida. Como já anteviu Isaías, Ele é o servo que oferece a Sua vida por nós, sofrendo em nosso lugar: Ele tomou sobre Si «as nossas dores»(Is 53, 11).

Jesus nunca foi «a-pático». Jesus foi sempre — e literalmente — «sim-pático», isto é, sofreu por nós, sofreu em nosso lugar. Fez Suas as nossas dores para que nós possamos fazer nosso o Seu amor, o Seu desmedido amor. A existência de Jesus não é «centripetada»; é totalmente «centrifugada». É por isso que Ele é capaz de nos compreender e de Se compadecer por nós (cf. Heb 4, 15).

 

  1. Procuremos ir sempre ao encontro de Jesus, sabendo — e sentindo — que Ele vem primeiro ao nosso encontro. Mas procuremos ir para aprender com Jesus. Procuremos ir cheios de confiança a este «tono da graça» onde alcançamos a «misericórdia» e a ajuda em «tempo oportuno» (cf. Heb 4, 16). Essa ajuda nunca nos faltará na vida e na nossa missão durante a vida. Mas nunca esqueçamos que a missão consiste não em fazer o que nós queremos, mas o que Deus quer.

A missão também exige conversão. É decisivo haver uma conversão à missão e uma conversão na missão. A missão não existe para que Deus faça o que Lhe pedimos, mas para que nós façamos o que Deus nos pede (cf. Mc 10, 35-44). A missão não é, pois, uma questão de competência, mas de generosidade. Estamos dispostos a fazer o que Deus nos pede, o que Deus quer? Uma coisa é certa. Na nossa generosidade — muito mais do que nas nossas ambições — estará a nossa plena felicidade!

Do blogue THEOSFERA

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