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A. Somos transportadores das maravilhasde Deus
É esta a nossa prioridade, é este o nosso desígnio, é esta a nossa missão. É isso o que faz S. João, que nos apresenta a primeira maravilha realizada por Jesus. Não esqueçamos que o milagre é o que nos faz maravilhar. O milagre é, todo ele, um acto de maravilhamento. Tal como os discípulos daquele tempo, também nós, discípulos deste tempo, ficamos maravilhados com os gestos de Jesus, com as palavras de Jesus, com a pessoa de Jesus. Será lícitoarmazenar toda esta maravilha só em nós?
Não por acaso — nada é por acaso —, S. João usa a palavra sinal («semeión») para falar de milagre. O milagre não é um acto diletante nem, muito menos, um exercício de prestidigitação ou ilusionismo. O milagre ocorre na fé: desperta a fé e fortalece a fé. S. João chama sinais aos milagres de Jesus porque sabe que eles revelam a pessoa e a missão de Jesus. Com este primeiromilagre-sinal em Caná, Jesus «manifestou a Sua glória e os discípulos acreditaram n’Ele»(Jo 2, 11).
B. Acreditar é deixar-se maravilhar
3. Diante das maravilhas de Deus, diante de tantas maravilhas de Deus realizadas em Cristo, também nós somos convidados a acreditar. Acreditar é maravilhar, é deixarmo-nos maravilhar diante da luz. Sobretudo quando tememos — e trememos — nas sombras, é fundamental que nos maravilhemos diante da luz trazida por Jesus.
Só esta luz ilumina. Só esta luz clarifica. Só esta luz aquece. E quem acende esta luz? É Jesus, o Filho de Deus. Jesus é a luz que acende sempre a luz.
Tudo aconteceu em Caná. Só S. João fala desta terra (cf. 4, 46 e 21, 2). Tradicionalmente, é identificada como Kefr Kenna, que fica a 7 quilómetros a nordeste de Nazaré, embora as indicações de Flávio Josefo levem a pensar também nas ruínas de Hirbet Qana, que se situa a 14 quilómetros para norte de Nazaré.
C. A nossa vida está naquelas talhas vazias
5. Somos igualmente informados de que este episódio se verificou «ao terceiro dia»(Jo 2, 1). Trata-se do «terceiro dia» após o chamamento de Filipe, descrito em Jo 1, 43. Numa subtil alusão ao início do Génesis, este «terceiro dia» depois daquele chamamento coincidiria com o «sétimo dia» da semana inaugural da missão de Jesus. No fundo, é um símbolo da nova criação. Aliás, toda esta semana é paradigmática. Sendo uma semana que precede a primeira Páscoa vivida por Jesus na Sua missão pública (cf. Jo 2, 13), desagua no sinal das bodas, que antecipam a glória da Ressurreição (cf. Jo 2, 11). Com efeito, a Ressurreição também acontece «ao terceiro dia» como o próprio Jesus vaticina (cf. Jo 2, 19).
Por outro lado, esta primeira semana inaugura a primeira etapa da revelação, na qual Jesus Se manifesta a todos (Cf. Jo 2, 1-4, 54): aos discípulos (cf. Jo 2, 1-11), ao povo (cf. Jo 2, 13-23), a um mestre da Lei, Nicodemos (cf. Jo 3, 1-21), aos samaritanos (cf. Jo 4, 1-41) e aos próprios pagãos (cf. Jo 4, 43-54).
O cenário de um casamento é o mais indicado para mostrar o amor que, em Jesus, Deus vem trazer ao mundo. E para testemunhar a mudança que, no mesmo Jesus, Deus vem oferecer à nossa vida. Jesus está no mundo para transformar o mundo, para transformar cada vida que há no mundo. A nossa vida está sinalizada nas talhas sem vinho (cf. Jo 2, 3). Ou seja, sem Jesus, não somos nada. Pior, sem Jesus, estamos cheios de nada.
D. Maria só tem palavras para Jesus e sobreJesus
7. A primeira a aperceber-se disso é Maria, a Mãe de Jesus. Maria sabe que, sem Jesus, é o vazio, é a indigência, é a carência. É por isso que as duas únicas referências a Maria no quarto Evangelho surgem revestidas de uma intensa significação. Maria está em Caná, onde Jesus simboliza a mudança que vem trazer. E Mariaestá junto à Cruz, onde Jesus realiza a mudança que veio propor. Na presença de Sua Mãe, Jesus transforma o antigo em novo, preenchendo todos os vazios que, sem Ele, se acumulam.
Também não é em vão que surgem aqui as únicas palavras de Maria em todo o Evangelho de S. João. Não são, contudo, palavras circunstanciais, mas palavras referenciais. Em Caná, como em toda a parte (e sempre), Maria só tem palavras para Jesus e só tem palavrassobre Jesus. Que melhor modelo de discípulo pode haver?
Já em Caná, a presença de Maria é o que viria a ser por todo o sempre: uma presença de intercessão e uma presença de anunciação. Para Maria, viver é interceder. Para Maria, estar é anunciar.
E. A mulher serva é (também) a mulher sábia
9. Junto de Jesus, intercede: «Não têm vinho»(Jo 2, 3). Isto é, falta o essencial, falta o importante, falta Jesus. Pensando bem, o que Maria pretende dizer é que aquela gente tem falta de Jesus. A resposta de Jesus não deve ser pintada em tons de rispidez. De resto, Maria não a entendeu como tal. Quando Jesus diz que ainda não tinha chegado a Sua hora (cf. Jo 2, 4), dá a entender que essa Sua hora está quase a chegar. O sinal que iria realizar era como um despertador para a chegada dessa Sua hora.
Do mesmo modo, o tratamento dispensado por Jesus a Maria não denota falta de respeito: «Mulher, que me desejas?»(Jo 2, 4). Ou, segundo outras versões, «Mulher, que tem isso a ver conTigo e coMigo?» Desde logo, «mulher» alude a Maria como «nova Eva», como Mãe da nova humanidade e Mãe da Igreja. E, quanto ao não terem vinho, o que Jesus quer frisar é que isso é com o Pai (cf. Jo 4, 34; 5, 19). O que Ele vai fazer é em nome do Pai. Ele e o Pai são um só (cf. Jo 10, 30).
Escutemos, então, Maria quando nos pede para fazer o que Jesus tem para nos dizer. A vontade de Maria é que façamos o que Jesus nos diz. Em cada dia!
Do blogue THEOSFERA