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UM POUCO DE ESPERANÇA JÁ É MUITO

por Zulmiro Sarmento, em 04.02.15
 
  1. A juventude entusiasma, mas também preocupa. Sentimos que há toda uma geração motivada pelo sonho, mas igualmente tolhida por muitos bloqueios.

Não podemos dar muito aos jovens. Mas, pelo menos, não deixemos de lhes dar esperança.

 

  1. Retenhamos estas palavras — imaginem! — de Elvis Presley: «Tudo o que os jovens precisam é de esperança e do sentimento de que pertencem a algo. Se eu pudesse fazer ou dizer alguma coisa que desse a eles este sentimento, eu acredito ter contribuído em algo para o mundo».

Como dizia Teilhard de Chardin, «o futuro pertencerá àqueles que derem ao mundo um pouco de esperança». Um pouco pelo menos. Um pouco de esperança já é muito.

 

  1. William Shakespeare vincou que «os homens deviam ser o que parecem ou, pelo menos, não parecerem o que não são».

O problema é que nem este mínimo está garantido. Há quem seja mestre na «arte» de enganar. E nem os mais inteligentes advertem o engodo.

 

  1. É possível enganar alguém durante algum tempo. Não é impossível enganar muita gente durante muito tempo.

Mas é completamente impossível enganar toda a gente durante todo o tempo.

 

  1. Não somos apenas aquilo que temos, aquilo que conseguimos, aquilo que realizamos. Somos também — e bastante — aquilo que não possuímos, aquilo que não alcançamos, aquilo que não obtivemos.

Se repararmos bem, estamos quase sempre a pensar naquilo que nos falta. O que nos falta é, assim, aquilo que mais nos acompanha. O que nos falta torna-se, portanto, paradoxal. Por um lado, esvazia-nos. Por outro lado, preenche-nos. Sufoca-nos?

 

  1. O mal está a tornar-se banal. Já ninguém se espanta com ele. Muitos até lhe asseguramcidadania. Não poucos até o publicitam, sobrevivendo à custa da sua divulgação.

Eis o maior cancro destes tempos sombrios: a banalidade do mal. Haverá pessoas luminosas que lhe ponham fim?

 

  1. A escola prepara para o teste e deve preparar sobretudo para a vida. É por isso que a educação é mais que o ensino. O conhecimento é fundamental, mas o comportamento é decisivo.

Alain anotou: «Os trabalhos de estudante são provas para o carácter e não para a inteligência. Seja ortografia, versão ou cálculo, trata-se de aprender a querer». Sem carácter, nem a inteligência consegue ser inteligente.

 

  1. A palavra depende da frase. A frase depende do texto. O texto depende do contexto. Tudo o que é dito revela sempre quem o diz.

Karl Kraus achava até que «as boas opiniões não têm valor. Depende de quem as tem». A mesma coisa afirmada por pessoas diferentes tem uma valoração distinta. Não basta invocar autoridade. É preciso revelar credibilidade. E a credibilidade não vem dos lábios. Vem da vida.

 

  1. Manhã, tarde, noite. Noite, manhã, tarde. Tarde, noite, manhã. Tão depressa se termina. Tão rapidamente se recomeça.

Montaigne tinha razão: «O mundo não passa de um balanço perene». Que, neste «balanceamento», nunca deixemos a verdade e que a paz nos possa visitar sempre.

 

  1. A vontade não consegue tudo, mas é fundamental para conseguir tudo. Já Alexandre Herculano dizia: «Querer é quase sempre poder: o que é excessivamente raro é o querer».

Queira querer. Hoje. Agora. Já!

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publicado às 11:45

NEM SEMPRE O PASSADO ESTÁ ULTRAPASSADO

por Zulmiro Sarmento, em 30.01.15
 

O novo é sempre sedutor. Mas será que é o melhor?

Eis a pergunta que urge fazer, mas que pouco se faz.

O novo é visto como sinónimo de mudança e de progresso. Nem sempre, porém.

Há valores e princípios que, vindos do passado, estão longe de estar ultrapassados.

É preciso discernir.

Há coisas que mostraram valer durante tanto tempo. Porquê descartá-las tão sumariamente?

Por vezes, a alternativa ao antigo não é o novo, mas o vazio.

Nem tudo o que vem do passado é para manter. Mas é igualmente verdade que nem tudo o que chega do passado é para eliminar.

Desconstruir por desconstruir pode trazer danos irreparáveis.

Há valores e princípios que não são antigos nem novos. São perenes.

Valem para sempre. Para hoje também!

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publicado às 13:59

CADA COISA NO SEU LUGAR

por Zulmiro Sarmento, em 29.01.15
 

Um convívio é bom. Um convívio com cânticos, com celebrações, com alegria é excelente. Mas não se chame a um convívio retiro. Convívio é uma coisa, excelente. Retiro é outra coisa, óptima também.

Como a própria palavra sugere, retiro implica que as pessoas se retirem dos lugares que habitualmente frequentam e dos comportamentos que habitualmente têm.

É por isso que há casas especialmente vocacionadas para isso, casas de retiro. E é por isso que o perfil de um retiro é marcado pelo silêncio, pela ausência de ruído.

Cada actividade tem a sua identidade. Participemos em tudo o que é bom. O que é bom faz bem. Mas mantenhamos a identidade de cada coisa!

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publicado às 11:28

NEM MATAR NEM OFENDER

por Zulmiro Sarmento, em 27.01.15
 

 

  1. Que devemos fazer para que a violência acabe? Ou, melhor, que devemos não fazer para que a violência termine?

 

Pelo que se vê, o problema tem estado no que se faz. A agir e a reagir, a atacar e a defender, não temos conseguir estancar a hemorragia de violência que se abateu sobre o mundo.

 

  1. Assim sendo, o mais avisado será pensar não no que se deve fazer, mas no que se deve não fazer.

Tendo em conta que toda a vida é inviolável e que toda a pessoa é sagrada, então nenhuma vida pode ser eliminada e nenhuma pessoa poderá ser ofendida.

 

  1. O consenso é imperioso, mas a convergência parece inviável.

Os que matam invocam motivos para estar ofendidos. Os que ofendem não encontram motivos para ser mortos.

 

  1. Acresce que estas posições coexistem no mesmo tempo e disputam o mesmo espaço.

O mesmo lugar pode abrigar culturas diferentes e concepções opostas.

 

  1. Discordar é legítimo e incomodar até pode ser saudável. Mas ofender será, alguma vez, dignificante?

Há quem defenda a liberdade de ofender como uma consequência da liberdade de expressão. Podemos deslizar, porém, por um caminho sinuoso.

 

  1. Com efeito, não faltará quem alegue a violência como uma extensão dessa mesma liberdade de expressão.

Se uns se exprimem ofendendo, outros tenderão a exprimir-se vingando-se da ofensa.

 

  1. Pergunta-se se uma liberdade com limites será liberdade. Mas será que o ilimitado está ao alcance do humano?

Se a própria vida tem um limite, como é que no decurso da vida se pode arrogar algo ilimitado?

 

  1. Se a liberdade de alguém fosse ilimitada, como é que a liberdade dos outros poderia ser exercida?

A convivência entre pessoas terá de ser um esforço de coexistência entre liberdades.

 

 

  1. O que para nós é aceitável, para os outros pode ser inadmissível.

Não é lícito que qualquer opinião seja vista como uma ofensa. Mas também não é curial que a ofensa seja olhada como mera opinião.

 

  1. Procuremos ver sempre o lado dos outros. Ou será que a «cegueira individualista» nos está a contaminar, impedindo-nos de ver para lá de nós? Matar não tem justificação possível. Mas ofender também não tem defesa convincente.

Entretanto, o desprezo vai cavando muitas feridas. E o ódio vai fazendo imensas vítimas…

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publicado às 12:56

A escolha

por Zulmiro Sarmento, em 23.01.15

 

 
Pode parecer estranho dizer que a alegria é o resultado das nossas escolhas. Com frequência imaginamos que algumas pessoas têm mais sorte do que outras e que a sua alegria ou tristeza dependem das circunstâncias da sua vida – sobre a qual não têm controlo.
 
No entanto, temos uma hipótese de escolha, não tanto em relação às circunstâncias da nossa vida, quanto em relação à maneira como reagimos a essas circunstâncias. Duas pessoas podem ser vítimas do mesmo acidente. Para uma, ele torna-se motivo de ressentimento. Para outra, motivo de gratidão. As circunstâncias externas são as mesmas, mas a opção pela forma de reagir é completamente diferente. Algumas pessoas tornam-se ásperas à medida que envelhecem, outras envelhecem alegremente. Isso não significa que a vida daqueles que se tornam ásperos tenha sido mais dura do que a daqueles que se tornam alegres. Significa que foram feitas diferentes escolhas, escolhas interiores, escolhas do coração.
 
É importante darmo-nos conta de que em cada momento da nossa vida temos a oportunidade de escolher a alegria. A vida tem muitas facetas. Há sempre facetas tristes e alegres na realidade que vivemos. E, por isso, temos sempre a possibilidade de viver o momento presente, como causa de ressentimento ou como causa de alegria. É na escolha que reside a nossa verdadeira liberdade. E esta liberdade, em última análise, é a liberdade de amar.
 
É capaz de ser uma boa ideia perguntarmos a nós mesmos como é que desenvolvemos a nossa capacidade de optar pela alegria. Talvez possamos reservar alguns momentos no final do nosso dia, para ver como é que o passámos – seja o que for que tenha acontecido – e agradecer a oportunidade de o ter vivido. Se assim o fizermos, aumentaremos a capacidade do nosso coração para optar pela alegria. E, ao construirmos um coração mais alegre, tornar-nos-emos, sem nenhum esforço extraordinário, fonte de alegria para os outros. Assim como a tristeza origina tristeza, assim a alegria origina alegria.
 
Henry Nouwen, Aqui e Agora, Vida no Espírito, 1996

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publicado às 13:47

Muita gente que quase enlouquece por causa do futebol devia ler isto…

por Zulmiro Sarmento, em 22.01.15

 

 

Tento sempre tirar lições positivas ou negativas dos acontecimentos. O mundo do futebol – esse desporto que entusiasma tanta gente até ao tresloucamento de alguns – oferece lições com interesse em que vale a pena reflectir.

Há treinadores que se entregam apaixonadamente à sua missão, julgando com justiça, dando o seu saber, a sua dedicação, a presença junto da sua família e quantos outros sacrifícios, para elevar o seu clube à vitória, algumas vezes ao pódio máximo. Recebem então elogios de toda a gente ligada ao seu clube e exterior a ele. Louvores da imprensa, da direcção, dos aficionados, aplausos de todo aquele mundo.

Mas quando os resultados começam a descer, tantas vezes por motivos alheios ao treinador, a admiração por ele começa também a descer e todos esquecem as vitórias anteriores, os campeonatos ganhos, as glórias alcançadas. Tudo o vento do esquecimento levou…

Segue-se a rescisão do contrato, a despedida amarga e até o espectro cruel do desemprego. É este um retrato de todos os dias do futebol da vida.

Sempre que alguém rende na sua actividade, os êxitos são reconhecidos, apreciados e louvados.

Mas quando a idade avança, quando a saúde falha, quando o desgaste debilita, quando as circunstâncias não são favoráveis, os maus resultados são imputados ao responsável, o apreço desaparece, os valores são esquecidos e segue-se a rescisão do contrato e a despedida.

É esta incoerência injusta, que continuará a ser praticada, no mundo do futebol e fora dele, por todos quantos olham os seus colaboradores apenas pela óptica dos resultados e das vitórias…

Mário Salgueirinho

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publicado às 12:15

Nem eu...

por Zulmiro Sarmento, em 19.01.15

JE SUIS CHARLIE?... NÃO, EU NÃO SOU CHARLIE!

 


No domingo, dia 11 de janeiro, de cartazes na mão, chefiados e presididos por muitos chefes políticos de primeira linha, franceses e estrangeiros, alguns armados de alguma hipocrisia e outros carregados de muito oportunismo, desfilaram pelas ruas de Paris milhares e milhares de defensores da liberdade de expressão. Reagindo contra o atentado das vésperas, pretendiam os participantes manifestar-se contra a violência e o terror.
- JE SUIS CHARLIE! - gritavam.
Como eles, eu também me confesso defensor da liberdade: da de expressão e das outras.
A liberdade de pensar, de escolher e de viver é um dom sagrado de Deus, que ninguém deve menosprezar nem roubar seja a quem for. A liberdade de expressarmos as nossas ideias, de manifestarmos as nossas opiniões e de revelarmos os nossos pensamentos, é algo indispensável para sermos pessoas, para marcarmos os nossos caminhos, e para construirmos o mundo em que pretendemos viver.
Por isso é que não posso nem quero apoiar censuras, represálias ou boicotes, sobretudo quando as armas usadas são a violência e o crime, e por isso não posso deixar de condenar, veementemente, o ato de terror acontecido nas intalações do jornal “Charlie Hebdo”, causando a morte de pessoas inocentes que estavam no seu trabalho. Atos destes não têm desculpa divina nem perdão humano. Ninguém de bom senso poderá aprová-las ou concordar com elas.
Há porém outra face da moeda.
A liberdade tem limites e deve ter regras. Não vale tudo.
Esse CHARLIE, sai das regras e ultrapassa as fronteiras. Tive o cuidado de consultar na net alguns exemplares do mesmo jornal, com datas anteriores. E que vi eu?
Entre outras caricaturas, censuráveis, ou pelo menos muito discutíveis, pude ver a representação das Pessoas da Santíssima Trindade a ter relações homosexuais, com as seguintes legendas: Le PERE, LE FILS, LE SPRIT SAINT, MARIAGE HOMO; LE VINGT-TROIS A TROIS PAPAS.
Traduzo, para alguém que precise: Pai, Filho e Espírito Santo: Casamento Homosexual. O Arcebispo de Paris – Monsieur Le Vingt-Trois – tem três pais!..
Numa outra, está a Virgem Nossa Senhora, de pernas abertas em grande plano, em estado de parto, a ter “LE PETIT JESUS”.
Isto é de um péssimo mau gosto, de uma enorme irresponsabilidade, e vergonhosamente ofensivo para todos os crentes, e sobretudo para os cristãos! Para mim, pelo menos, é!! Ofende-me no mais íntimo do meu ser! Magoa-me nas minhas mais profundas convicções!
Eu aprecio e admiro muito as boas caricaturas... mas caricaturas destas, não. Nunca.
Infelizmente, em nome de uma falsa liberdade de expressão que esta Europa endeusou e agora adora e canta, que eu saiba, ninguém reagiu a essas caricaturas. Estamos numa sociedade anestesiada por um laicismo perigoso e doentio que, em nome de uma liberdade absoluta, mata todos os dias doutrinas, verdades, princípios e valores na mente e no coração dos cidadãos ocidentais. E, assim sendo, tudo se tolera e tudo se acha moralmente bom ou defensável.
Já nem a Igreja reage? Há muitos modos de reagir, sem usar insultos ou praticar terrorismos! Mas não reage! E assim, com o silêncio da Igreja, o laicismo prossegue livremente a sua campanha de destruição do que ainda resta, e toma conta de tudo, e de todos.
Esta deusa LIBERDADE foi posta num altar ou num andor pelos iluministas do século XVIII. E, desde então, incorporaram-se numa procissão cujo fim se não divisa, os jacobinos, os liberais, os maçons, os agnósticos, os laicos, os republicanos, e muitos, muitos mais.
Se eu me incorporasse nessa grandiosa “procissão” de Paris, o meu cartaz não diria “JE SUIS CHARLIE” mas antes “JE SUIS CONTRE LE TERRORISME”.
Como podia eu apoiar um jornal “Irresponsable” que se diz ateu confesso, que tem como programa zombar de todas as religiões, e como lema ridicularizar tudo o que é religioso? O seu conteúdo existencial é uma sátira constante e contínua à fé dos crentes.
Talvez sem o saberem, que fizeram esses milhões de manifestantes? Apoiaram o jornal, os seus fins e os seus métodos, puseram no pedestal o cartonista que esteve na origem da intervenção terrorista, e incentivaram-no fazer mais imagens do género para serem publicadas no jornal que se seguiu. E o jornal foi procurado por tantos, tantos, em longas filas indianas, indiferentes ao mau tempo, que não chegou para a procura!
Penso que não é este o caminho para a paz mundial e para o fim do terrorismo internacional. Pôr-mo-nos em bicos de pé e mostrar a nossa força, só pode causar mais ódios e provocar mais reações.
Neste campo, como noutros, bem anda o Papa Francisco ao favorecer o respeito por todas as diferenças e ao congregar os esforços de todas as religiões, na luta pela justiça e ela paz no mundo.
Concluo, dizendo bem alto:
Não! Eu não sou “Charlie”! Não quero ser “Charlie”!
Parem com o terrorismo!
Mas parem também com as injúrias e as ofensas aos valores e à fé dos outros!
Joaquim Correia Duarte, in Facebook

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publicado às 09:48

Terra de excelência...

por Zulmiro Sarmento, em 14.01.15

MAIS UM DIA C (CR7)


 
 O prémio atribuído a Cristiano Ronaldo encerra alguns ensinamentos. Descontando, pois, a compreensível euforia de momentos como este, destacaria sobretudo duas importantes lições.

Em primeiro lugar, fica provado que Portugal é terra de excelência. Há portugueses que ombreiam com os melhores e que são capazes de ser, inclusive, os primeiros na sua profissão.

 

Num universo tão competitivo como o futebol profissional, dá que pensar ver como o melhor nasceu neste nosso país. E repare-se que foi necessário singularizar a partir de um leque vastíssimo onde a competência é muita e a competição bastante.

 

Ser o melhor e ser português é, por isso, uma conjugação que nos deve encher de alegria. Numa altura em que a nossa auto-estima está a cair, faz bem olhar para estes fenómenos. Também em Portugal é possível emergir o que há de melhor.

 

Em segundo lugar (e, talvez, este dado contraste com o anterior), fica a ideia de que o português, para singrar, tem de sair.

 

Se Cristiano Ronaldo não tivesse saído do Sporting, alguma vez obteria o mesmo reconhecimento? O talento seria o mesmo, mas a projecção seria igual?

 

Diga-se o mesmo de Luís Figo. Também ele é português. Também ele foi considerado o melhor do mundo. Mas, para isso, também ele teve de sair de Portugal.

 

Especulativamente, podemos conjecturar. Se o Sporting, além de formar óptimos jogadores, tivesse condições de os segurar, onde não estaria ele? Se ao talento formativo aliasse capacidade financeira, não estaríamos em presença de um potencial dominador do futebol europeu? Já viram o que seria uma equipa com Cristiano Ronaldo, Quaresma, Simão, Futre, Figo, etc.?

 

Se pensarmos bem, é o que se passa em vários domínios. Eduardo Lourenço é português, mas vive fora de Portugal. António Damásio é português, mas afirmou-se longe de Portugal. D. José Saraiva Martins idem.

 

Portugal é capaz de produzir o que há de melhor. Mas só quando se sai de Portugal é que o reconhecimento chega. Seremos melhores lá fora? Teremos de sair para ser?

 

Fatalidade? Não quero crer. Realidade? Sim. Realidade que importa estudar e urge superar.

 

Fica claro que Portugal é terra de excelência. Que nos falta para conseguirmos cá dentro o que obtemos lá fora?

Fonte: aqui

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publicado às 10:51

Isto é, ou não é, o verdadeiro Islão?!

por Zulmiro Sarmento, em 12.01.15

 

O incidente com o jornal Charlie Hebdo chocou-nos a todos e gerou uma onda de solidariedade por todo o mundo, mas também fez sair cá para fora os lugares-comuns de sempre, que em nada contribuem para o debate.

 

Começo com um que ouvi esta manhã de um respeitado comentador de assuntos internacionais, quando questionado sobre a importância da religião neste fenómeno do terrorismo. Resposta pronta: “Isto não tem nada a ver com a religião! Isto é terrorismo puro”.

 

Desculpa? Um grupo de homens que se identificam acima de tudo como muçulmanos atacam um jornal conhecido por gozar com a sua religião (entre outras), gritando palavras de ordem como “Deus é Grande” e “Vingámos o profeta” e isso não tem nada a ver com religião?

 

No dia seguinte outro  homem que se identifica como muçulmano mata a tiro uma mulher polícia e, passadas 24 horas, entra numa loja judaica de produtos kosher onde faz reféns, e isto não tem nada a ver com religião?

 

Uma coisa é discutir se estes homens e os seus actos são verdadeiramente representativos da religião que dizem professar, (já lá vamos), mas dizer que isto não tem nada a ver com religião é absurdo. Claro que tem tudo a ver com religião. Pode haver outros assuntos à mistura, não nego. Pode ter a ver com imigração, com políticas de integração, com racismo, com muita coisa. A Ana Gomes até acha que a culpa é da austeridade... mas não me venham dizer que não tem nada a ver com religião.

 

Nunca é demais repetí-lo: A religião é um fenómeno potentíssimo, no sentido em que move o ser humano a fazer coisas de grande dimensão. Para o bem, como felizmente vemos tantas vezes em tantas pessoas fantásticas que se dão inteiramente para ajudar os seus irmãos e vizinhos, mas também para o mal, como já vimos muitas vezes na história e vimos por estes dias em Paris.

 

“Isto não é o verdadeiro Islão”

Antes de mais convém ver quem é que está a dizer isto.

 

Se for o Sheikh David Munir, como muitas vezes o faz, é uma coisa. Ele é uma autoridade na comunidade islâmica, é um conhecedor do Islão e um líder muçulmano com um longo passado de participação civil e em actos de diálogo inter-religioso. Podemos discutir com ele se tem razão ou não, mas aceito a autoridade que ele tem para dizer que o que aqueles dois irmãos fizeram não é representativo do verdadeiro Islão.

 

O que não aceito é que o Zé da Esquina, que aparece como convidado para falar no telejornal, mas sabe tanto sobre o Islão como eu sei sobre física quântica, diga que isto, ou qualquer outra coisa, é representativo do verdadeiro islão. Como não aceito que o diga o Obama ou o Cameron, ou o Passos Coelho, ou sequer o o Papa Francisco.

 

Não é representativo porquê? Acaso eles se consideram mais conhecedores dos ensinamentos islâmicos que os pregadores que radicalizaram estes e tantos outros terroristas? Sabem recitar o Alcorão? Sabem explicar as suas passagens? Sabem explicar as incongruências que existem no texto?

 

Não é o verdadeiro Islão porquê? Porque não vos apetece? Porque é politicamente correcto dizê-lo? Porque ouviram o Sheikh David Munir a dizê-lo? É que se for esse o caso então citem-no, mas não falem como se tivessem um pingo de autoridade para estar a dizer a dois muçulmanos qual deles é que é verdadeiro e qual é que é falso.

 

Eu não sei se isto é o verdadeiro Islão ou não. O que sei é que neste momento há uma divisão no interior do Islão (uma de muitas), entre as pessoas que acham que sim e as que acham que não.É um problema, e é grave, seria ingénuo negá-lo. É uma questão que mundo muçulmano tem de enfrentar e tem de tentar resolver. É um debate que tem de se travar a nível teológico e a nível filosófico, e não com slogans e frases bonitas. Não basta catalogar uma corrente como não-islâmica e esperar que desapareça. Não vai desaparecer.


“O Islão é isto mesmo”

Aqui aplica-se exactamente a mesma lógica, mas ao contrário. É isto mesmo, por alma de quem? Porque vêem alguns muçulmanos a comportarem-se assim? Então os milhares que vivem pacificamente, que defendem os seus vizinhos cristãos, que pagam impostos e não sonhariam olhar de lado para um polícia, quanto mais matá-lo a sangue frio... estão enganados?

 

Também aqui, não reconheço a 99% das pessoas que o dizem qualquer autoridade para o fazerem. Claro que podem ter a sua opinião, mas ninguém é obrigado a dar-lhes importância.

 

Mas esta frase tem uma agravante. É que enquanto a anterior corre o risco de ser demasiado ingénua, não é uma particular ameaça. Esta, pelo contrário, incita à divisão social e ao ódio e, acima de tudo, só pode servir para radicalizar ainda mais os muçulmanos que a ouvem.

 

Estes terroristas que atacaram o Charlie Hebdo odeiam-nos. Não odeiam só os que fazem caricaturas de Maomé, odeiam-nos a todos, as nossas religiões, o nosso estilo de vida, a nossa maneira de vestir, os nossos hábitos, a nossa democracia, os nossos valores, os nossos direitos. A pior coisa que podemos fazer, em resposta aos seus ataques, é incentivar divisão social e purgas que, levadas ao extremo, representam precisamente o mesmo que eles querem: separação, ausência de direitos e liberdades, morte e terror.

 

Então não podemos dizer nada?

Eu sei que custa muito, hoje em dia, assumirmos que não temos certezas, mas é um exercício de humildade que nos fica bem. Quando me pedem a opinião sobre estes assuntos eu digo sempre que não sei. Os terroristas e o Estado Islâmico representam o verdadeiros Islão? Ou são os Sheikhs David Munir e os milhares de muçulmanos, como é o caso em Portugal, que vivem a sua vida em paz, contribuem para a sociedade e não chateiam ninguém?

 

Não sei. Não sou muçulmano e por isso não tenho nada que opinar sobre isso, da mesma maneira que acharia de uma tremenda arrogância o Sheikh David Munir ou outro qualquer vir opinar sobre quem representa o verdadeiro Cristianismo, os católicos liberais, ou os conservadores, ou os protestantes, ou os lefebvrianos.

 

O que posso dizer é que sei muito bem de quais gosto mais! Disso não há a menor dúvida. Posso dizer que independentemente de quem tem razão nesse debate teológico interno, eu preferia sentar-me à mesma mesa com alguém da linha do Sheikh David Munir do que com alguém que abraça os ideias dos jihadistas. E isso já não é coisa pouca, a meu ver.

 

Porque aquilo que eu amo sobre a nossa sociedade e os nossos valores não são as caricaturas nojentas que jornais como o Charlie Hebdo tanto gostam de publicar, são os valores que permitem que eles o façam e que ao mesmo tempo protegem a minha liberdade de dizer que não os quero ler, não os acho piada e não quero ter nada a ver com eles. Os valores que eu amo são os que me permitem sentar à mesma mesa que um muçulmano e partir pão com ele e discutir com ele temas do Céu e da Terra, de vida ou de morte, em paz. A salvaguarda desta realidade é algo que é muito mais importante, nesta altura, do que a repetição de frases politicamente correctas, mas racionalmente ocas.

Fonte aqui

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publicado às 10:43

Coisas que acontecem na sacristia e na rua...

por Zulmiro Sarmento, em 11.01.15

Como penso que deveria ser um bom guia espiritual


 


Um dia destes uma paroquiana, com idade para ser minha mãe, entrou pela sacristia dentro só para me dizer que tinha uma admiração especial pelo padre da freguesia, sobretudo porque tinha sempre uma palavra, uma resposta, um caminho para apontar às suas inquietações. O senhor padre é um bom guia espiritual. Agradeci amavelmente e prossegui nos meus afazeres, para que a vaidade não subisse para cima da mesa de altar. No mesmo dia, porém, e talvez para o Senhor Deus reforçar a ideia de que o altar não tem espaço para vaidades, alguém se dirigiu a mim para uma outra palavra, num sentido quase igual, mas diametralmente oposto. Tinha idade para ser minha irmã, a senhora que me disse que não entendia como tinha sempre uma palavra, uma resposta para todas as perguntas que me eram feitas. Não se coibiu, inclusive, de acrescentar que lhe dava ideia de que eu tinha a mania que sabia tudo. Mas não sei. E também não sei se quero saber tudo, pois acho que no dia que soubesse tudo, deixaria de caminhar. Acabei por partilhar com esta segunda senhora o que há muito me parece uma verdade, ainda que não tenha a certeza. Um bom guia, inclusive ou sobretudo o guia espiritual, não é aquele que tem todas as certezas, mas aquele que as aponta.

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publicado às 11:16


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