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Ser hoje luz num tempo de sombras, parece ser o “destino” de cada um de nós no tempo que passa, num tempo que passa e que dói, que dói esta dor funda da impotência, da impotência diante dos gigantes das sombras que se agigantam e que parecem querer tomar de assalto tudo o que mexe, tudo o que respira e tudo o que sonha. Por isso hoje é tempo de NATAL com menos, mas um Natal melhor!
O mundo, o país e cada um de nós, vive tempos de esperança e de mudança, em que o novo surge como a nova fronteira a conquistar, mas onde o medo e os medos teimam em formar barreira diante dos olhos, destes olhos feitos para ver a luz, feitos para encarar o medo, feitos para não terem de ver o sol só refletido nos charcos. Por isso hoje é tempo de NATAL com menos, mas um Natal melhor!
Se calhar, a maior conquista do tempo do medo que passa, foi precisamente esta de nos ter tirado a capacidade de ousar levantar a cabeça, de ousar olhar para além do imediato do já, em direção ao menos “imediato” do ainda não, mas que está e vive em tensão de devir, de futuro, de projeção para diante, num diante que encontra a utopia e faz dela o sonho, um sonho que vence o medo, um sonho que se abre à luz. Por isso hoje é tempo de NATAL com menos, mas um Natal melhor!
É por aqui que passa o segredo, este segredo que invejosamente levamos dentro sem partilhar, que envergonhada e pudicamente escondemos e que não conseguimos dar à luz e que nos faz gemer, gemer as dores do parto que tarda, gritar o grito das vozes caladas. Por isso hoje é tempo de NATAL com menos, mas um Natal melhor!
E no entanto, a gravidez do tempo existe, as dores do parto afligem-nos, o nascimento tarda em acontecer, e o meu povo sofre, e a minha gente grita, o grito surdo que a voz rouca não é capaz de calar, mas que o medo embota, e que o desespero não deixa encontrar a paz. Por isso hoje é tempo de NATAL com menos, mas um Natal melhor!
Neste tempo de vozes que gritam, que gritam a esperança que não é, que gritam promessas que não são, que esboçam sorrisos que são só esgares, eu paro e pasmo, qual basbaque embrutecido diante do palácio da ignomínia alcandorado em conto de fadas, das mil e uma noites de uma aurora boreal que é só ilusão e nada, de um nada que teima em ser e de um ser que já não é. Por isso hoje é tempo de NATAL com menos, mas um Natal melhor!
E eu caminho, oh sim, caminho ao mesmo tempo em direção ao nada e ao ser, em direção ao outro e a mim, em direção ao nada e ao tudo, deixando para trás o passado que já foi, indo ao encontro do futuro que parece tardar em vir, no presente que cada vez que se deixa tocar no futuro que se torna passado, porque afinal, não existe. Por isso hoje é tempo de NATAL com menos, mas um Natal melhor!
E é aqui que começa a minha “crise”, a crise de saber quem sou, onde estou, como estou, quem serei, como serei, onde estarei, como estarei! E é aqui que me dou conta de mim, da minha pequenez de ser, mas de um ser que é, de um ser chamado à existência nesse espaço virtual entre o já e o ainda não, entre o abismo do tudo e a profundidade do nada, num silêncio às vezes só habitado por fantasmas e por vozes, onde a minha se confunde, mas não deixa de existir e de falar. E de dizer NATAL! Por isso hoje é tempo de NATAL com menos, mas um Natal melhor!
Fantasmas e vozes de mim, deste ser que me habita e que eu procuro, deste ser que é e que é eternidade, uma eternidade que é já, que é este hoje do meu ser, que é ao mesmo tempo nada e tudo, porque sou eu, em relação comigo, em sorrisos e lágrimas, em alegrias e desesperos, em sonhos e fantasias, em “nadas” e em “tudos” que me habitam, que me “moram” onde eu moro, seja onde for, porque o meu “eu” não tem “lugar”, é, simplesmente, e pronto, comigo, em mim e para além de mim, porque infinito, porque eterno, porque tudo e porque nada, porque é, ao mesmo simultaneamente eternidade e tempo, imanência e transcendência, limite e infinito, kairós e eskaton, já e ainda não. Por isso hoje é tempo de NATAL com menos, mas um Natal melhor! FELIZ NATAL! Frei Fernando Ventura, franciscano capuchinho |