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Há coisas que, desde muito novo, me fazem alguma confusão. De entre muitas destaco, a acomodação (desistência, desmotivação) tem sido uma das que mais me torturam: vi pessoas, que em tempos foram destemidas e de grande valor humano, cultural e intelectual... a desistirem, acomodando-se quase de uma forma cobarde; tenho visto figuras de relevo (dentro ou fora da Igreja) a resignarem-se pela negativa, quais vencidos pelas agruras e pelo desinteresse dos demais; podemos captar na sociedade tanta gente (mais velhos e já muitos novos) vergada pela incompreensão dos seus ideais, derrotados pelas convicções dos medíocres!
Mas será que este diagnóstico tão sombrio retrata mais uma visão pessoal do que uma situação geral? Teremos (quase) todos a capacidade de análise pela negativa porque nos educaram sem valorizarem o nosso positivo? Estaremos, de facto, condenados a deixar este mundo pior do que quando o encontramos? Até que ponto irá – pela acomodação e/ou pela desmotivação – a capacidade de resistência para não desistirmos, seja qual for a dificuldade, interior ou exterior?
* Subjugados pelo medo ou pela ignorância?
Causou alguma estranheza a recente observação de um anterior Presidente da República Portuguesa em ter dito que estamos a ser vencidos pelo medo, sendo este difundido nas mais variadas instâncias e até por agentes quase insuspeitos. De facto, o medo está palpável no nosso tempo e quantos/as dele se servem para aprisionar os outros, sabem-no ardilosamente.
Há, com efeito, uma panóplia de situações em que o medo – físico, psicológico/afectivo, moral/social, espiritual/religioso – é a melhor arma de subordinação de uns tantos sobre outros. Quantas vidas são coarctadas pela simples afronta do medo. Quantas personalidades amesquinhadas porque amordaçadas pelo medo. Quantas mentalidades instrumentalizadas pela paralisia criada pelo medo.
- Não será que muitas famílias – marido/esposa, pais/filhos, irmãos/tios, avós/netos – se conduzem mais pelo medo do que pela confiança e a ternura?
- Não será que muitas das relações de trabalho – sobretudo nesta fase de incerteza e de insegurança – são abespinhadas pela incerteza do futuro?
- Não será que muitos crentes – particularmente quando a ignorância reina e o oportunismo se insinua – fazem com que Deus se pareça ‘uma espécie de chapéu de aba larga’, ao Qual recorrem só nas horas de dificuldade?
Temos de sacudir, urgentemente, tantos sinais de medo, alicerçando-nos, progressivamente, na esperança... cristã.
* Debandar: arma dos fracos ou recurso dos espertos?
Perante certos episódios de debandada – seja por razões claras, seja por motivos mais ocultos – vamos assistindo, nos mais diversos campos de actuação à fuga deambulatória da assumpção dos mínimos critérios de vida coerente e em sinceridade: há quem se considere acima da lei, como se esta fosse um parâmetro para os mais fracos e um areópago só para os ricos; outros tentam influenciar quem deles possa falar (vizinhança, tertúlia de café, comunicação social, etc.) mais ou menos abonatoriamente... por algum tempo de antena; uns tantos intentam arvorar-se em régulos da consciência alheia, pelo menos na versão de que quanto piores (no seu preconceito) forem os outros, tanto melhores serão vistos, parecendo que estarem na lista dos ‘menos maus’... até ver!
Quem tiver uma consciência – sobretudo cristã – correctamente formada, perceberá que temos de ser fortes na luta contra certas forças eivadas de maledicência e com intenções crispadas de mentira e de submissão às insídias do mal.
Por isso, ousamos propor:
- Quando a desmotivação nos assaltar, queremos dizer: vence em nós, poder de Deus.
- Quando a tristeza invadir o nosso rosto, queremos pedir: conquistai-nos pela alegria, Jesus.
- Quando a inquietação quiser arreliar-nos, saibamos suplicar: dai-nos a paz, Espírito Santo.
Prestes a começar a Quaresma citamos a mensagem do Papa Bento XVI: «Nos nossos dias, a prática do jejum parece ter perdido um pouco do seu valor espiritual e ter adquirido antes, numa cultura marcada pela busca da satisfação material, o valor de uma medida terapêutica para a cura do próprio corpo. Jejuar sem dúvida é bom para o bem-estar, mas para os crentes é em primeiro lugar uma «terapia» para curar tudo o que os impede de se conformarem com a vontade de Deus».
Assim saibamos, nesta Quaresma, jejuar, física, psicológica e espiritualmente, para sabermos vencer a tentação da desistência, da tristeza e da desmotivação – artimanhas do mal – e diante da insensibilidade aos outros e a Deus... em nós e à nossa volta.
Sílvio Couto - ECCLESIA