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A. Tornámo-nos obcecados com a felicidade
Dá a impressão de que aquilo que nos torna infelizes é, desde logo, o (obsessivo) desejo de ser feliz. Quando um desejo é forte, a frustração costuma ser grande. Não percebemos que a felicidade não vem, magicamente, quando a queremos. Ela só vem quando a procuramos, quando a descobrimos. É isso o que (nos) falta: procurar a felicidade, descobrir a felicidade.
Que cada um comece, então, por querer ser «pobre de espírito» (Mt 5, 3), por chorar com quem chora (cf. Mt 5, 4), por ter «fome e sede de justiça» (Mt 5, 6). Que cada um queira ser manso, misericordioso, construtor da paz e «limpo de coração» (Mt 5, 7-9).
4.O Mestre tornou bem claro que «há mais felicidade em dar do que em receber» (Act 20, 35). Em suma, é preciso sair de nós para ver a felicidade entrar em nós! O Evangelho deste Domingo a Magna Carta da Felicidade, segundo o enunciado das Bem-Aventuranças.
Refira-se que as Bem-Aventuranças são fórmulas relativamente frequentes na tradição bíblica e judaica. Aparecem, quer nos anúncios proféticos de alegria futura (cf. Is 30,18; 32,20), quer nas acções de graças pela alegria presente (cf. Sal 32,1-2), quer nas exortações a uma vida sábia, reflectida e prudente (cf. Prov 3,13; 8). Contudo, elas definem sempre uma alegria oferecida por Deus.
C. Uma felicidade surpreendente
5. As Bem-Aventuranças do Evangelho devem ser entendidas no contexto da pregação sobre o Reino. Jesus, que sempre esteve com os fracos e os pobres, proclama bem-aventurados aqueles que estão numa situação de debilidade e de pobreza. É que Deus instaura o Reino e a situação dos pobres vai mudar radicalmente. Além disso, são bem-aventurados porque, na sua fragilidade e pobreza, estão de espírito aberto e coração disponível para acolher a proposta de salvação e libertação que Deus lhes oferece em Jesus.
As quatro primeiras Bem-Aventuranças referidas por Mateus (cf. Mt 5, 3-6) estão relacionadas entre si. Dirigem-se aos pobres. As segunda, terceira e quarta Bem-Aventuranças são desenvolvimentos da primeira, que proclama bem-aventurados os pobres em espírito.
Os «pobres em espírito» são aqueles que aceitam renunciar, livremente, aos bens, ao próprio orgulho e auto-suficiência, para se colocarem, incondicionalmente, nas mãos de Deus, para servirem os irmãos e partilharem tudo com eles.
D. Ao contrário do que estamos habituados
Os mansos não são os fracos, os que suportam passivamente as injustiças, os que se conformam com as violências orquestradas pelos poderosos; mas são aqueles que recusam a violência, que são tolerantes e pacíficos, embora sejam, muitas vezes, vítimas dos abusos e prepotências dos injustos. A sua atitude pacífica e tolerante torná-los-á membros de pleno direito do Reino. Os que choram são aqueles que vivem na aflição, na dor, no sofrimento provocados pela injustiça, pela miséria, pelo egoísmo; a chegada do Reino vai fazer com que a sua triste situação se mude em consolação e alegria.
A quarta bem-aventurança proclama felizes os que têm fome e sede de justiça. Provavelmente, a justiça deve entender-se, aqui, em sentido bíblico, isto é, no sentido da fidelidade total aos compromissos assumidos para com Deus e para com os irmãos. Jesus dá-lhes a esperança de verem essa sede de fidelidade saciada, no Reino que vai chegar.
Os puros de coração são aqueles que têm um coração honesto e leal, que não pactua com a duplicidade e o engano. Os que constroem a paz são aqueles que se recusam a aceitar que a violência e a lei do mais forte rejam as relações humanas; e são aqueles que procuram ser, às vezes com o risco da própria vida, instrumentos de reconciliação entre os homens.
E. Esperança e alento
9. Os que são perseguidos por causa da justiça são aqueles que lutam pela instauração do Reino e são desautorizados, humilhados, agredidos, marginalizados por parte daqueles que praticam a injustiça, que fomentam a opressão, que constroem a morte. Jesus garante-lhes que o mal não os poderá vencer. Na última bem-aventurança (cf. Mt 5, 11), o evangelista dirige-se, em jeito de exortação, aos que têm a experiência de ser perseguidos por causa de Jesus e convida-os a resistir ao sofrimento e à adversidade. Esta última exortação é, na prática, uma aplicação concreta da oitava bem-aventurança.
No seu conjunto, as Bem-Aventuranças deixam uma mensagem de esperança e de alento para os pobres e débeis. Anunciam que Deus os ama e que está do lado deles; confirmam que a libertação está a chegar e que a sua situação vai mudar; asseguram que eles vivem já na dinâmica desse Reino onde vão encontrar a felicidade e a vida plena.
Na primeira leitura, o profeta Sofonias denuncia o orgulho e a auto-suficiência dos ricos e dos poderosos e convida o Povo de Deus a converter-se à pobreza. Os pobres são aqueles que se entregam nas mãos de Deus com humildade e confiança, que acolhem com amor as suas propostas e que são justos e solidários com os irmãos. Na segunda leitura, São Paulo denuncia a atitude daqueles que colocam a sua esperança e a sua segurança em pessoas ou em esquemas humanos e que assumem atitudes de orgulho e de auto-suficiência; e convida os crentes a encontrar em Cristo crucificado a verdadeira sabedoria que conduz à salvação e à vida plena.
Do blogue Na Paz A Verdade
A. Deus está sempre a chamar
Assim é Deus connosco, assim faz Deus com cada um de nós. Deus chama por nós. Deus nunca Se cansa de chamar por nós. Como refere o Apocalipse, Ele está sempre à porta a chamar (cf. Ap 3, 20). Só que Deus nem sequer espera pelo nosso nascimento. No livro do profeta Jeremias, podemos encontrar este dado lapidar. Antes de cada um de nós nascer, Deus já está a chamar. Ele já nos conhecia antes de ser formados no ventre materno. Foi já aí que nos consagrou (cf. Jer 1, 5).
Não são apenas as portas de casa que estão fechadas. Fechadas estão também muitas portas do nosso coração, muitas portas da nossa alma, muitas portas da nossa vida. Não fechemos, pois, o que Deus abriu. Deus está sempre a abrir todas as portas. Como dizia São João Paulo II, abramos nós também — escancaremos nós também — as portas ao Redentor.
B. Os principais chamamentos de Deus
3. A missão é uma invasão, uma saudável invasão. Deus está sempre a vir para a nossa vida invadir. Deus está sempre a chegar para o nosso mundo transformar. Deus chama como a nossa mãe, Deus chama como mãe. Sendo nosso Pai, Deus ama-nos com amor de mãe.
Daí que Deus esteja sempre a chamar para nos convocar. São sobretudo três os chamamentos que Deus faz. São especialmente três as convocações que Deus nos dirige.
Deus não pára de chamar. Será que nós nos desabituamos de responder? Como acabámos de ver, Deus nem sequer espera que nos desocupemos. Deus vem ter connosco mesmo quando estamos ocupados. Como saudável — e persistente — Invasor, Deus nunca deixa de nos acenar com o Seu amor.
C. Lancemos as redes e trabalhemos em rede
5. Encontramos Jesus a invadir a vida destes dois pares de irmãos. Primeiro foi ter com Pedro e seu irmão André, que estavam a lançar as redes (cf. Mt 4, 18). Depois, foi ter com Tiago e seu irmão João, que se encontravam a consertar as redes (cf. Mt 4, 21). No fundo, propôs-lhes que continuassem a mesma actividade. Propôs-lhes que continuassem a pescar. Só que, em vez de continuarem a pescar peixes, propôs-lhes que passassem a pescar homens (cf. Mt 4, 19).
Jesus quer que continuemos a lançar redes e que trabalhemos sempre em rede. É necessário lançar redes e é urgente trabalhar sempre em rede. O que, muitas vezes, nos falta é a prontidão e a disponibilidade destes quatro (primeiros) discípulos.
A presença de Jesus, em cada instante, é sempre instante. Ou seja, é uma presença que insta connosco, que surge em tons de urgência, que não admite adversativas, ressalvas ou alegações. Jesus é do género «tudo ou nada».
D. A missão só é total com uma entrega incondicional
7. Muitas vezes, a nossa resposta, quando acontece, parece cheia de adversativas, cheia de «mas», «porém», ´«contudo», «no entanto» (cf. Lc 9, 58-62). Afinal, ainda não estamos dispostos a ser invadidos por Deus. Ainda estamos muito ciosos da nossa independência, do nosso reduto, das nossas possessões.
Pensamos que aquilo que é nosso nos pertence, que vem de nós. Esquecemos que tudo é de Deus, que tudo vem de Deus, que tudo é dom de Deus. E esquecemos também que só com esta divina invasão é que ocorre a nossa libertação.
Do que se trata na questão vocacional é de uma escuta atenta e de uma entrega total. A missão só é total com uma entrega incondicional. Mas, para termos a disponibilidade de Marta, é indispensável crescer na capacidade de escuta de Maria (cf. Lc 10, 38-42). Deus não quer mobilizar apenas o nosso agir. Ele pretende invadir todo o nosso ser.
E. Comecemos a anunciar Jesus pelas periferias sem luz
9. A oração é, por conseguinte, a eterna parteira da missão. Só quem escuta Jesus tem condições para seguir Jesus. Ele está sempre a nossa beira para invadir a nossa vida inteira. O Reino de Deus já não está próximo (cf. Mt 4, 17). O Reino de Deus já está no meio de nós. O apelo à conversão há-de ser, pois, cada vez mais acolhido no nosso coração.
A missão começa sempre pela conversão. Jesus não se esquece de tal apelo fazer. Estaremos nós com vontade de o acolher? Eis o que dos Seus lábios nos vem: «Arrependei-vos» (Mt 4, 17), hoje e amanhã também. Há quem faça gala de nunca se arrepender. Nesse caso, como pode a mudança acontecer?
A terra de Zabulão ainda hoje faz divisão com o sul do Líbano e com a Síria. A terra de Neftali fica do outro lado do Jordão, já dentro do Líbano e da Síria actuais. Eram, portanto, territórios paganizados pela idolatria reinante. Já Isaías entreviu que uma grande luz aqui iria brilhar (cf. Is 9, 1-2). A grande luz, que é Jesus, nunca deixa de brilhar. Por ela deixemo-nos iluminar. Abramos, pois, o nosso coração à divina invasão. Quem por Deus se deixar invadir, paz e felicidade há-de sempre sentir!
Do blogue Na Paz A Verdade
Muito estranho é este mundo. Muito estranhos somos nós neste mundo.
Fazemos tudo para estar conectados com quem está longe. E parece que não fazemos nada para ligar a quem está perto.
E é assim que nos vamos distanciando de quem está próximo. Não sei se nos aproximaremos alguma vez de quem está distante.
As ruas das nossas terras estão cheias de gente que não olha para a frente nem para os lados. Apenas olha para baixo: para o telemóvel.
Esta gente procura alguém no outro lado. Mas nem se apercebe de quem vai passando (mesmo) ao seu lado!
*
Achava Umberto Eco, de saudosa memória, que «nem todas as verdades são para todos os ouvidos».
Mas toda a verdade tem de ser para toda a vida. Não metade da verdade para metade da vida, mas toda a verdade para sempre.
Nem sempre se pode dizer tudo. Mas nunca se deve dizer o contrário de nada.
A verdade pode ferir durante algum tempo, mas a mentira acaba por magoar para sempre!
www.portonovo.blogs.sapo.pt
A. No Tempo Comum, o Mistério continua a ser Incomum
A nossa participação é que não pode ser menos numerosa ou menos activa. O Tempo Comum é também um tempo comunitário, o tempo para a comunidade.
Espanta, porém, que, sendo este um dado tão antigo e tão constante, seja também algo tão esquecido por muitos cristãos. Como é possível que muitos de nós não celebrem o acontecimento central da nossa fé e da nossa vida?
B. Em cada semana, uma festa
3. Não basta a celebração anual nem chega uma celebração ocasional. Já quando os cristãos eram perseguidos, faziam todos os possíveis — às vezes, no limiar do próprio impossível — para não prescindirem do Domingo. «Não podemos viver sem o Domingo», disseram muitos mártires antes de serem mortos.
É bom não esquecer que também houve muitos mártires do Domingo. Ainda hoje há quem, sobretudo na África e nas Américas, faça dezenas — e até centenas — de quilómetros para celebrar o Domingo. E nós, que ainda temos a possibilidade de celebrar o Domingo à porta de casa, que esforço fazemos?
Eis, por isso, uma missão que desponta à nossa frente: ajudar os nossos irmãos a virem a esta grande festa semanal. O terceiro Mandamento da Lei de Deus e o primeiro Mandamento da Santa Igreja impelem-nos para isso. O terceiro Mandamento da Lei de Deus lembra-nos a obrigação de santificar o Domingo (que é o novo Sábado) e Festas de Guarda. Por sua vez, o primeiro Mandamento da Santa Igreja concretiza em que consiste essa santificação: participar na Missa inteira no Domingo e Festas de Guarda.
C. O Precursor abre caminho para o Salvador
5. O Tempo Comum é, portanto, um tempo belo e sempre luminoso, centrado na luz da Ressurreição e na força vitamínica do Pão da Vida. Essa beleza e essa luminosidade do Tempo Comum estão sinalizadas pela cor do paramento litúrgico. O verde, que é a cor dominante na Primavera, simboliza a o ressurgimento da natureza após o desterro provocado pela invernia. Tem, por isso, afinidades com o que celebramos na Páscoa: o ressurgimento da vida após a morte. Trata-se do ressurgimento não para a vida anterior, para uma vida totalmente nova.
O verde é, por conseguinte, a cor que está associada à novidade e, nessa medida, à esperança. Ao celebrarmos a Páscoa em cada Domingo, vamos fortalecendo a esperança na última vinda do Senhor Jesus. De resto, é o que ouvimos no «embolismo», isto é, na oração que dá continuidade ao Pai-Nosso. Depois de pedir a Deus a libertação do mal e a paz para os nossos dias, o presidente da celebração, em nome da comunidade, testemunha a nossa esperança «na vinda gloriosa de Jesus Cristo, nosso Salvador».
O Precursor abre, assim, caminho para o Salvador. O baptismo de João era um baptismo de penitência. O baptismo de Jesus é o baptismo no Espírito Santo. O que fez João é o que nós somos convidados a fazer: a dar testemunho de Jesus.
D. O Superior que aparece como Servidor
7. Descrito como «o Cordeiro de Deus» (Jo 1, 29), Jesus aparece no mundo como Servo. Aliás, a Sua Mãe também Se apresenta como Serva (cf. Lc 1, 38). Ou seja, o Servo nasce da Serva. Não obstante a Sua condição divina, Jesus é o Superior que aparece como Servidor. Nunca é demais insistir que Jesus veio ao mundo para servir, não para Se servir. Ele está no meio de nós como quem serve (cf. Lc 22, 27).
Uma vez que somos Seus discípulos, então como Ele fez, façamos nós também (cf. Jo 13, 15). Procuremos estar na vida não como superiores, mas como servidores: como servidores de Deus e como servidores dos outros homens. E tanto melhor serviremos os outros homens quanto mais os aproximarmos de Deus. Nos tempos que correm, Deus é a grande carência, Deus é a maior urgência.
É importante, por isso, que o nosso coração não esqueça o que os nossos lábios, há pouco, entoaram: «Eu venho, Senhor, para fazer a Vossa vontade» (cf. Sal 40, 8). Aliás, é o que estamos sempre a repetir quando recitamos a oração que Jesus nos ensinou: «Seja feita a Vossa vontade» (Mt 6, 10). O próprio Jesus, uma vez mais, dá-nos o exemplo. No momento decisivo, pede a Deus que O afaste da Cruz. No entanto, ressalva de imediato: «Faça-se a Tua vontade e não a Minha» (Mt 22, 42).
E. Palavra para ouvir e Pão para repartir
9. A divina vontade é a nossa felicidade. A divina vontade há-de ser, pois, a nossa prioridade. Aprendamos, por isso, a procurar e a cumprir a vontade de Deus. Não confundamos — o que é uma tentação frequente — a vontade de Deus com os nossos desejos.
Nunca deixemos vazio o nosso lugar na Festa semanal da Páscoa. É Cristo quem nos convida. Vamos deixar que a Sua proposta fique esquecida?
Vamos prometer que com o Evangelho nos queremos comprometer. O Evangelho é Palavra para ouvir e Pão para repartir. É nele que está a mudança e a razão para a nossa esperança. Este mundo ainda pode mudar se o Evangelho quisermos testemunhar. Não adiemos para amanhã o Evangelho que urge anunciar hoje!
Blogue Na Paz a Verdade
Ao longo deste tempo de Natal, ouvimos anunciar que «uma virgem conceberá»(Is 7, 14) e, de facto, a Virgem concebeu (cf. Lc 1, 31-38). Também ouvimos vaticinar que seria de Belém, terra de Judá, que iria sair o Pastor de Israel (cf, Miq 5, 1). E, na verdade, foi em Belém que Jesus nasceu (cf. Mt 5, 1). Acabamos de ouvir falar dos que haviam de vir de longe para cantar as glórias do Senhor (cf. Is 60, 1-6). E eis que o Evangelho nos reporta a vinda de pessoas que, efectivamente, vêm de muito longe procurar o Senhor (cf. Mt 2, 1).
Como bem notou S. Paulo, todos, em Cristo Jesus, «pertencem ao mesmo Corpo e beneficiam da mesma Promessa»(Ef 3, 6). Caem pois os muros, só ficam as pontes. Todos estamos ligados a todos através do Pontífice, isto é, d’Aquele que faz as pontes: o próprio Jesus.
B. Número, nome e condição dos mago
3. O Evangelho, com extrema parcimónia, apresenta-nos «uns magos»(Mt 2, 1). Não refere nem o seu número nem o seu nome. Nem sequer diz que seriam reis, assim chamados talvez pela alusão que o Salmo 72 faz aos reis que viriam pagar tributo e oferecer presentes (cf. Sal 72, 10). A designação de magos não se reporta seguramente a artes mágicas, mas ao estudo dos astros.
Cedo, porém, a tradição entrou em campo. Quanto ao número, foi fácil chegar a três por causa dos presentes que levaram: ouro, incenso e mirra (cf. Mt 2, 11). Ouro porque aquele Menino era Rei, incenso porque aquele Menino era Deus e mirra porque aquele Menino iria ser Mártir. Remontará a esta oferta o costume de dar presentes nesta época natalícia. No que respeita à identidade dos magos, há um evangelho apócrifo arménio, datado do século VI, que refere o nome, a condição e a proveniência. Assim, Baltasar seria rei da Arábia, Gaspar seria rei da Índia e Melchior seria rei da Pérsia. Tal escrito também diz que seriam irmãos e que a viagem que fizeram teria demorado nove meses, chegando a Belém na altura do nascimento de Jesus.
De acordo com uma tradição medieval, os magos ter-se-iam reencontrado quase 50 anos depois de terem estado com Jesus, em Sewa, na Turquia, onde viriam a falecer. Mais tarde, os seus corpos teriam sido levados para Milão, onde teriam permanecido até ao século XII, quando o imperador alemão Frederico terá trasladado os seus restos mortais para Colónia.
C. Um mistério de mostração
5. Acerca da estrela que viram, também tem havido não poucos palpites. Muitos têm identificado aquela estrela com o cometa Halley, que foi visto por volta dos anos 12-11 a.C. Também poderia ser uma luz resultante da tríplice conjunção de Júpiter e Saturno na constelação de Peixes, ocorrida em 7 a.C. Há ainda quem fale de uma «nova» ou «supernova», visível por volta dos anos 5-4 a.C.
Esta estrela pode ser vista como um símbolo messiânico insinuado já no livro dos Números, quando o Balaão diz que «um astro procedente de Jacob se torna chefe»(Núm 24,17). Também Isaías garante que «o povo que andava nas trevas viu uma grande luz, uma luz raiou para os que habitavam uma terra sombria»(Is 9, 1).
A Epifania é, toda ela, uma festa de luz, de uma luz que ilumina toda a terra. Esta festa autentica a universalidade da missão de Jesus. Jesus manifesta-Se a todos, dá-Se a conhecer a todos. E a manifestação é essencialmente uma automanifestação. Em Jesus, Deus manifesta-Se a Si mesmo, dá-Se a conhecer a Si mesmo. A Epifania não é, portanto, um mistério de demonstração, mas de mostração. E Deus mostra-Se de uma forma disponível, despojada e encantadoramente humilde.
D. Uma festa que chegou a englobar o Natal
7. Aliás, é o que depreende do magnífico conto de Sophia de Mello Breyner. Baltasar, em nome dos outros magos, foi consultar os homens da ciência e da política para que lhes dissessem onde estava o «Rei dos Judeus» (cf. Mt 2, 2). Decepcionado com a resposta, virou-se para os homens da religião. É que encontrara um altar dedicado ao «deus dos poderosos», outro ao «deus da terra fértil» e outro ao «deus da sabedoria». Insatisfeito de novo, perguntou aos sacerdotes pelo «deus dos humilhados e dos oprimidos». Resposta dos sacerdotes: «Desse deus nada sabemos». Então Baltasar subiu ao terraço e «viu a carne do sofrimento, o rosto da humilhação». Deus estava ali, o Deus que os sacerdotes desconheciam.
Deus está, desde os começos, nos humilhados e oprimidos (cf. Mt 25, 40). E foram muitos os que, também desde os começos, O encontraram na humildade e entre as vítimas da opressão.
Como sabemos, não é conhecido o dia exacto do nascimento de Jesus. S. Clemente de Alexandria indica que uns celebravam o Natal a 28 de Março, outros a 19 ou 20 de Abril, outros a 20 de Maio ou, então, na festa da Epifania. A opção por 25 de Dezembro deveu-se ao facto de, nessa altura, se celebrar em Roma a festa do «Sol invicto». Uma vez que o verdadeiro sol é Cristo, os cristãos optaram por cristianizar esta festa pagã, celebrando nela o nascimento do Salvador.
E. Um misto de aceitação, rejeição e indiferença
9. No Oriente, criou-se a 6 de Janeiro a festa da Epifania, cujo conteúdo era inicialmente variável conforme as regiões: nascimento de Jesus, bodas de Caná, Baptismo de Jesus. Muito depressa, ainda no século IV, o Ocidente acolheu a festa da Epifania, mas deu-lhe, sobretudo em Roma e no Norte de África, um conteúdo inteiramente novo: a adoração dos magos.
Foi esta evolução que ditou a actual estrutura do Tempo do Natal: Natal a 25 de Dezembro, Epifania a 6 de Janeiro e Baptismo do Senhor no Domingo depois da Epifania. No fundo, entre o Natal e a Epifania há um intercâmbio de significado. Celebra-se o mesmo em ambos os casos: a manifestação de Deus aos homens. No Natal e na Epifania, celebramos portanto a mesma Teofania.
Não basta, com efeito, conhecer Jesus, é fundamental ir ao encontro d’Ele para O anunciar. Uma vez que Ele Se dá totalmente, é de esperar que também nos demos inteiramente. Ele vem para mudar os nossos passos. Por isso é que os magos regressaram à sua terra por outro caminho (cf. Mt 2, 12). Quando nos encontramos com Jesus, que é o caminho (cf. Jo 14, 6), os nossos caminhos são outros. Transformemos, então, a nossa vida. Convertamo-nos Àquele que Se converteu a nós, Àquele que Se fez um de nós. Se Deus veio ao nosso encontro, não deixemos, também nós, de ir ao encontro de Deus. E, em Deus, procuremos ir ao encontro de todos!
Blogue Na Paz a Verdade
Após os desejos habituais, eis que nos preparamos para as amargas desilusões de sempre. À primeira vista, já nenhum ano parece ser novo. A própria palavra «novo» é bem antiga. Há quantos séculos não anda a humanidade a desenhar promessas de novidade?
O início de um ano sinaliza que a vida é um recomeço constante. Há 12 meses, também estávamos a começar um ano. Há 24 e há 36 meses, estávamos igualmente a começar outros anos. O que jamais podemos é desistir: não comecemos a desistir e nunca desistamos de começar.
B. Um dia para Jesus, um dia com Maria
Hoje ocorre a solenidade de Santa Maria, Mãe de Deus. Sendo Mãe de Cristo e sendo Cristo o Filho de Deus, os cristãos cedo perceberam que Maria era Mãe de Deus. Não era só Mãe do homem Jesus, mas Mãe do Filho de Deus que encarnou em Jesus. O Concílio de Éfeso oficializou esta doutrina em 431. S. Cirilo de Alexandria já tinha tornado tudo muito claro: «Se Nosso Senhor Jesus Cristo é Deus e se a Virgem Santa O deu à luz, então Ela tornou-Se a Mãe de Deus».
C. A paz tem um nome: Jesus
5. Foi por Maria que Jesus veio até nós. Será sempre com Maria que nós iremos até Jesus. Aquela que nos dá Jesus é sempre a melhor condutora para irmos ao encontro de Jesus. Façamos, portanto, como os pastores. Como os pastores, corramos (cf. Lc 2, 16). Procuremos ir depressa, sem demora, ao encontro de Jesus. O encontro com Jesus terá de ser sempre a prioridade da nossa vida e o centro da missão na vida.
Em Jesus, oferecido por Maria, encontramos o que mais procuramos para nós e o que mais desejamos para o mundo: a paz. Jesus não é apenas o portador da paz. Ele próprio é a paz hipostasiada. Aliás, é assim que o Messias é descrito por Miqueias: «Ele será a paz»(Miq 5, 5). Isaías apresenta o Menino «que nos nasceu» como o «príncipe da paz»(Is 9, 6). Por sua vez, os salmos apontam os tempos messiânicos como sendo marcados por uma grande paz (cf. Sal 72, 7).
É neste sentido que o Concílio Vaticano II recorda que a paz é muito mais do que a mera ausência de guerra. De resto, a ausência de guerra é, muitas vezes, ocupada com a preparação para a guerra. A paz é mais do que «pax», que, segundo os antigos romanos, resultava da negociação entre as partes desavindas. As partes continuavam desavindas, apenas não entravam em conflito. Semelhante é o conceito veiculado pelo grego «eirene». A paz, para os gregos da antiguidade, é uma tentativa de harmonia entre forças contrárias. As forças permanecem contrárias, unicamente não avançam para o combate.
D. Para estar no mundo, a paz tem de estar em cada pessoa
7. O hebraico «shalom» contém muito mais. A paz, aqui, é anterior a qualquer esforço humano. É um dom de Deus que faz o homem sentir-se completo, integral. É por isso que a paz só estará no mundo se estiver em cada pessoa que há no mundo. Antes da negociação, é fundamental pugnar pela conversão à paz. Jesus, no Sermão da Montanha, considera felizes os construtores da paz. Só eles serão «chamados filhos de Deus»(Mt 5, 9).
Importa perceber que o primeiro sinal de Deus é a paz. Quando Deus vem à terra em forma de criança, os enviados celestes entoam um cântico que diz tudo: «Glória a Deus nas alturas e paz na terra» (Lc 2, 14). A paz desponta, assim, como o grande indicador de que Deus já está entre nós.
Para 2017, assinalando o 50º Dia Mundial da Paz, o Papa Francisco propõe um tema de suma pertinência: «A não-violência como um estilo de política para a paz». É que, excelsando a paz, continuamos a lidar com focos de violência a cada instante. O Santo Padre mostra-se mesmo preocupado ante a possibilidade de estarmos a viver «uma terceira guerra mundial aos bocados». Em relação a uma tal terceira guerra mundial, ninguém a assume, mas todos a vamos sentindo. Sem paz, não há qualquer progresso. Só a paz abre as portas para «o verdadeiro progresso».
E. Antes de mais, importa atingir o zero
9. Afinal, ainda há aspectos onde nem sequer atingimos o «grau zero» de humanidade. Ainda há aspectos onde nos encontramos abaixo de zero. E abaixo de zero, tudo é negativo, tudo é negação. Como pode haver paz no mundo se no mundo não há justiça nem respeito pela dignidade humana? Temos, pois, um longo caminho a percorrer. Temos muito que fazer ou, como diria Sebastião da Gama, «temos muito que amar».
Diante dos que vaticinam o iminente fim da história, é importante começar com urgência uma história de re-humanização do mundo. Sim, porque a humanidade ainda consegue ser muito não-humana, muito desumana. Para re-humanizar o mundo, diria que duas são as coisas que têm de acabar já: a guerra e a fome. Consequentemente, duas têm de ser as coisas que importa assegurar desde já: paz para todos e pão para cada um. Para re-humanizar cada pessoa que há no mundo, duas são também as coisas a que urge pôr fim: egoísmo e violência. E duas serão igualmente as coisas que é imperioso introduzir: solidariedade e educação.
O novo ano pode nem ser melhor, mas nós podemos ser melhores no ano novo. Não é o ano novo que faz a vida nova. Só uma vida nova fará o ano novo. Só uma vida nova trará o tempo novo, o mundo novo!
Blogue Na Paz a Verdade