1. Por esta altura é já grande a fadiga e incontrolável a ansiedade. Até as crianças já perderam o encantamento da surpresa e a fantasia da expectativa do que poderão receber naquela noite santa. Agora fazem exigências, ainda por cima dispendiosas. Nos hipermercados acotovelam os pais: «Quero isto. E mais isto. E mais isto»…
Aos idosos, levamos apressadamente uma peça de roupa ou um bolo. E lá continuam eles na cama. Tantas vezes sozinhos. Quando muito, são convidados para a «consoada». Só que, na manhã de Natal, são reconduzidos ao abandono de há muito. À solidão de sempre.
Urge, pois, desmaterializar as ofertas de Natal. É preciso recordar que o maior presente é a presença. É a companhia. É o afecto. É o apoio. É a certeza de que alguém pode contar connosco.
Não nos esqueçamos de que, para muitos, a noite de 24 para 25 deste mês vai ser uma noite triste. Uma noite sofrida. Uma noite chorada.
A casa até pode estar repleta de coisas. E a alma também poderá estar cheia. Mas de mágoas. De dores. De ingratidões sem fim…
2. O Natal é habitualmente associado às crianças. Está certo. Na verdade, o Filho de Deus apareceu no mundo em forma de Menino. Mas será que já nos lembramos dos velhinhos? Será que já demos pela presença de Deus neles?
Será que já tivemos a preocupação de passar pelo leito em que se encontram e de depositar um beijo na sua face enrugada? Será que já tivemos a percepção de que beijar um velhinho é, hoje em dia, uma nova forma de beijar o Deus Menino?
É bonito ver tanta gente a oscular, comovida, a imagem de barro do Menino Jesus. Mas porque é que não mostramos a mesma reverência ante a Sua imagem de carne e osso? Não percas de vista, irmão, que o Menino não está só no presépio. Encontra-se igualmente no berço e nos hospitais. Tantas vezes, ignorado. Tantas vezes, esquecido e rejeitado.
3. Os tempos do Messias são marcados pela surpresa. Tudo é desconcertante. Maravilhoso. Arrebatador.
O que é incompatível compatibiliza-se. O que é inconciliável concilia-se. O que é impossível (finalmente) realiza-se. A novidade d'Aquele que há-de vir é a paz. A convivência. A harmonia universal.
Sucede que Ele já veio no tempo. Será, contudo, que O deixamos vir até nós? Se o lobo habita com o cordeiro, porque é que os humanos não conseguem conviver entre si? Na verdade, estamos num mundo que ainda não aprendeu a ser mundo. E somos homens que ainda não aprenderam a ser homens…
4. Há presépios lindos. Há presépios engenhosos. Há presépios deslumbrantes. Há presépios originais. Há presépios interessantes. Há presépios surpreendentes. E até há presépios ao vivo. Faltam, contudo, presépios vivos. Que, a bem dizer, são os únicos presépios necessários. Aqueles que são construídos não nas ruas ou nas casas. Mas no coração humano. No meu. No teu. No nosso.
É aí, irmão, que Ele — o Senhor — quer (re)nascer hoje. Vais consentir que Ele seja atirado novamente para um estábulo, como há dois mil anos? Não tardes, meu Deus! Acorda-nos da sonolência que nos envolve e da indiferença que nos cega!
Do blogue Na Paz a Verdade