por Zulmiro Sarmento, em 15.02.12
Foi tudo muito rápido. A executiva bem-sucedida sentiu uma pontada no
peito, vacilou, cambaleou. Deu um gemido e apagou-se. Quando voltou a
abrir os olhos, viu-se diante de um imenso Portal.
Ainda meio tonta, atravessou-o e viu uma miríade de pessoas. Todas
vestindo cândidos camisolões e caminhando despreocupadas. Sem entender
bem o que estava a acontecer, a executiva bem-sucedida abordou um dos
passantes:
- Enfermeiro, eu preciso voltar com urgência para o meu escritório,
porque tenho um meeting importantíssimo. Aliás, acho que fui trazida
para cá por engano, porque o meu seguro de saúde é Platina, e isto
aqui está a parecer-me mais a urgência dum Hospital público. Onde é
que nós estamos?
- No céu.
- No céu?...
- É.
- O céu, CÉU....?! Aquele com querubins, anjinhos e coisas assim?
- Exacto! Aqui vivemos todos em estado de graça permanente.
Apesar das óbvias evidências, ausência de poluição, toda a gente a
sorrir, ninguém a usar telemóvel, a executiva bem-sucedida levou tempo
a admitir que havia mesmo batido a bota.
Tentou então o plano B: convencer o interlocutor, por meio das
infalíveis técnicas avançadas de negociação, de que aquela situação
era inaceitável. Porque, ponderou, dali a uma semana iria receber o
bónus anual, além de estar fortemente cotada para assumir a posição de
presidente do conselho de administração da empresa.
E foi aí que o interlocutor sugeriu:
- Talvez seja melhor a senhora conversar com Pedro, o coordenador..
- É?! E como é que eu marco uma audiência? Ele tem secretária?
- Não, não. Basta estalar os dedos e ele aparece.
- Assim? (...)
- Quem me chama?
A executiva bem-sucedida quase desabava da nuvem. À sua frente,
imponente, segurando uma chave que mais parecia um martelo, estava o
próprio Pedro.
Mas, a executiva tinha feito um curso intensivo de approach para
situações inesperadas e reagiu logo:
- Bom dia. Muito prazer. Belas sandálias. Eu sou uma executiva bem-sucedida e...
- Executiva... Que palavra estranha. De que século veio?
- Do XXI. O distinto vai dizer-me que não conhece o termo 'executiva'?
- Já ouvi falar. Mas não é do meu tempo.
Foi então que a executiva bem-sucedida teve um insight. A máxima
autoridade ali no paraíso aparentava ser um zero à esquerda em
modernas técnicas de gestão empresarial. Logo, com seu brilhante
currículo tecnocrático, a executiva poderia rapidamente assumir uma
posição hierárquica, por assim dizer, celestial ali na organização.
- Sabe, meu caro Pedro. Se me permite, gostaria de lhe fazer uma
proposta. Basta olhar para essa gente toda aí, só na palheta e andando
a toa, para perceber que aqui no Paraíso há enormes oportunidades para
dar um upgrade na produtividade sistémica.
- É mesmo?
- Pode acreditar, porque tenho PHD em reorganização. Por exemplo, não
vejo ninguém usando identificação. Como é que a gente sabe quem é quem
aqui, e quem faz o quê?
- Ah, não sabemos.
- Percebeu? Sem controlo, há dispersão. E dispersão gera desmotivação.
Com o tempo isto aqui vai acabar em anarquia. Mas podemos resolver
isso num instante implementando um simples programa de targets
individuais e avaliação de performance.
- Que interessante...
- É claro que, antes de tudo, precisaríamos de uma hierarquização e um
organograma funcional, nada que dinâmicas de grupo e avaliações de
perfis psicológicos não consigam resolver.
- !!!...???...!!!...???...!!!
- Aí, contrataríamos uma consultoria especializada para nos ajudar a
definir as estratégias operacionais e estabeleceríamos algumas metas
factíveis de leverage, maximizando, dessa forma, o retorno do
investimento do Grande Accionista... Ele existe, certo?
- Sobre todas as coisas.
- Óptimo. O passo seguinte seria partir para um downsizing
progressivo, encontrar sinergias high-tech, redigir manuais de
procedimento, definir o marketing mix e investir no desenvolvimento de
produtos alternativos de alto valor agregado. O mercado telestérico,
por exemplo, parece-me extremamente atractivo.
- Incrível!
- É óbvio que, para conseguir tudo isso, teremos de nomear um board de
altíssimo nível. Com um pacote de remuneração atraente, é claro. Coisa
assim de salário de seis dígitos e todos os fringe benefits e
mordomias da praxe. Porque, agora falando de colega para colega, tenho
a certeza de que vai concordar comigo, Pedro. O desafio que temos pela
frente vai resultar num Turnaround radical.
- Impressionante!
- Isso significa que podemos partir para a implementação?
- Não. Significa que a senhora terá um futuro brilhante... se for
trabalhar com o nosso concorrente. Porque acaba de descrever,
exactamente, como funciona o Inferno...
Max Gehringer
(Revista Exame)
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por Zulmiro Sarmento, em 14.02.12
1. Amarás nas suas quatro dimensões
- Dimensão afectiva
- Dimensão espiritual
- Dimensão da amizade
- Dimensão sexual
2. Respeitarás o teu conjugue
O respeito perde-se:
- Pela palavra
- Pelo silêncio (silêncios que matam)
- Pelos gestos: (quando se chega a gestos violentos, acaba-se o matrimónio)
3. Conversarás com o teu conjugue
Saber escutar e falar
Não é mera tagarelice, mas partilha de tudo o que há no interior
4. Gastar-te-ás em detalhes para com o teu conjugue (essa flor, esse gesto, essa palavra que sabes que lhe agrada)
5. Cultivarás o sentido do humor. A vida não é uma comédia, mas também não uma tragédia. É um drama, com coisas boas e más.
6. Oferecerás ao teu conjugue um dia de passeio por mês, a sós, sem os filhos.
7. Viverás o matrimónio não como uma meta, mas como um caminho. Se o consideras uma meta, é como dizer “já cheguei”, então já tudo terminou, canso-me, aborreço-me, apoltrono-me e termino com outra.
8. Não falarás das ofensas, defeitos e falhas a cada momento. O que passou, passou.
9. Saberás perdoar, inclusivé a infidelidade.
10. Confiarás no teu conjugue. Os ciúmes matam o matrimónio.
Estes Dez Mandamentos devem sustentar-se em Deus, caso contrário são muito difíceis de cumprir.
Decálogo para ser fiel:
1) Reflectir sobre o sagrado do matrimónio aos olhos de Deus. É um caminho de realização pessoal e é sagrado porque vem de Deus, e o que Deus quer é sempre bom. É sagrado porque Cristo o elevou à dignidade de sacramento. É o símbolo do amor de Deus à humanidade. É muito proveitoso ler a carta dos Efésios.
2) Estar disposto a dar e a receber. Cada um tem um tesouro que deve estar disposto a compartilhar com o outro, cada um tem características próprias que deve por ao serviço do outro. A mulher é mais intuitiva, generosa, delicada, terna, com mais tacto. O homem é mais pragmático, racional, firme. Mutuamente devem compenetrar-se e complementar-se nas carências de cada um. Há que dar e receber. Se só damos, esvaziamo-nos, se só recebemos, somos egoístas. O amor é dar e receber.
3) Gastar-te-ás nos detalhes para com o outro. O detalhe é a essência, o extracto do amor. “Diz-me que detalhes tens com o teu esposo/a e dir-te-ei como é o teu amor”.
Detalhes que uma mulher pediria ao seu esposo:
· Não te queixes por estares esgotado pelo trabalho
· Não me interrompas quando estou a falar
· Depois de uma discussão, não passes três dias sem me falar, zangado
· Não me lembres continuamente as minhas faltas passadas
· De vez em quando diz-me que estou bonita e atraente
· Durante as refeições, presta-me atenção porque não sou uma parede
· Fala-me um pouco do que vais fazer, ainda que seja trivial
· Preocupa-te com os teus filhos quando chegas a casa
· Colabora nas tarefas domésticas
· Nalgum dia especial, leva-me a jantar fora
· Dá-me um beijo ao despedir-te.
Detalhes que um esposo pediria à sua mulher:
· Enche os meus tempos de descanso com paz e sossego e fala-me dos gastos no momento oportuno
· Gasta menos, sê mais económica
· De vez em quando elogia-me, elogia a minha carreira pois “o meu triunfo é também teu”
· Nunca compares o nosso matrimónio com outros
· Sê oportuna quando tiveres de me corrigir e nunca diante dos nossos filhos e amigos
· Não te queixes por tudo nem discutas por insignificâncias
· Não rejeites sistematicamente os meus programas de televisão, os meus gostos
4) Respeitar as características do outro. Não podemos mudar as características do outro, pelo contrário, devemos enriquecermo-nos com elas. O outro é diferente de ti, por isso respeita-o. O respeito significa capacidade de perdoar, abertura, não reparar nos defeitos do outro, compreensão. O respeito pode quebrar-se de três maneiras: com a palavra (dura, grosseira, ordinária), por actos (agressão física) ou com gestos (caras largas, desprezos, silêncios eloquentes). Há que saber ver as virtudes do outro e lisonjeá-las.
5) Evitar discussões desnecessárias. As discussões desnecessárias desunem e destroem a harmonia familiar. Não se deve discutir, deve-se analisar. Com as discussões ganham-se aborrecimentos, nervos, maus exemplos para os filhos, idas ao psicólogo ou ao psiquiatra.
6) Superar o passado para não voltar a antigos episódios de ofensas. ”Fugiste, disseste-me, deixaste de fazer, dizia-te”, são frases de censura. O passado há que perdoá-lo com magnanimidade. Sobre o passado deve-se construir um futuro de amor e perdão. Se se fala continuamente das ofensas, a ferida não cura, não cicatriza, continua a supurar e termina com lesões.
7) Dominar a tendência para controlar, vigiar o conjugue. “Que fizeste, com quem estiveste?”. O matrimónio tem de ter como base a confiança no outro. Se continuamente se desconfia do conjugue, se se tem medo da infidelidade, se se vive com zelos, esse matrimónio é um tormento. O conjugue não deve ser nunca polícia do outro conjugue, mas companheiro e amigo.
8) Cultivar o sentido do humor O bom humor oxigena o matrimónio. A vida não é uma tragédia nem uma comédia, é um drama com coisas boas e más. O humor alcança um bom nível de higiene mental. A pessoa sem humor torna-se desconfiada, mal-humorada, susceptível. O bom humor faz crescer o matrimónio em harmonia e paz.
9) Gratifica o teu esposo/a com um dia azul e cada ano com um bom presente. Há que romper com a monotonia, a rotina. Há que sair para passear com a esposa e filhos, levá-los a almoçar fora, oferecer-lhes algo de surpresa, sem ter de esperar por comemorações, aniversários, etc.
10) Integrar todos os aspectos do amor (afectivo, amistoso, sexual, espiritual). Afectivo: o amor afectivo comunica ternura. O que é a ternura? É esse meter-se no estado de ânimo do outro, partilhar esse ânimo. Como é possível que o esposo/a não se dê conta que o outro conjugue está doente, triste? Porquê? A ternura acerca-se da alma para dar compreensão ao outro, é altruísta, é desejo de compreensão, de aceitação do outro. Pelo contrário a sensualidade é egoísta, busca o seu próprio prazer, o seu próprio interesse de gozo. O amor efectivo no matrimónio manifesta-se através de uma carícia nobre, um sorriso. É desinteressado.
Sexual: O sexo é um instrumento que Deus criou com duas finalidades: procriar (comunicar a vida) e para crescer no amor, na entrega dentro do matrimónio. Deste modo o sexo converte-se numa linguagem interior profunda com a ânsia de transmitir ao outro o que somos. É a entrega de toda a pessoa, se não se dá isto, é pura satisfação. A pornografia distorce o sentido do sexo.
O corpo não é um bem de consumo, é instrumento de diálogo profundo de duas pessoas. Freud disse: “todos os males que nos acontecem, vêm-nos por reprimir o sexo” e aconselha dar-se o prazer. É evidente que esta afirmação é errada.
Mas por sua vez a Igreja tem a sua regra sobre a vida sexual a qual deve ser: serena, equilibrada, sã e dentro dos limites da dignidade humana. O sexo dentro do casal, não deve ser o mais importante, o único. Se estas relações começam assim vão por mal caminho já que divinizam, entronizam o sexo. O sexo é um meio para o fim que já explicámos antes. Converter o sexo num fim em si mesmo é um erro.
Amistoso: amar o outro como pessoa, respeitá-lo como tal. Encontrar no outro um outro eu com o qual partilhar alegrias, tristezas, consolos, dúvidas. É o amor que se dá ao outro na intimidade da pessoa. Revelamo-nos à pessoa a quem nos damos. Amar o outro buscando, querendo, protegendo, defendendo o bem do outro. O amor de amizade diz: eu quero-te porque és tu, faço-te feliz porque te quero, enquanto que o egoísta diz: fazes-me feliz porque me satisfazes. O egoísmo é o verme do amor. Ter um amigo é ter um tesouro, quem o encontre que não o perca. É um amor firme quando estamos débeis, alegre quando estamos tristes. Cristo é o nosso melhor amigo, logo deve seguir o conjugue com o qual vamos partilhar a nossa existência.
Espiritual: Amar o outro porque é filho de Deus, é irmão em Cristo e temos que o amar com as mesmas características do amor divino: com amor de perdão, aberto, que anima, que reparte tudo o que tem, que sabe ver detrás não só o esposo/a mas um filho de Deus. Deus ama a todos com amor espiritual e transmitiu-o à humanidade através de Cristo para que assim possamos amá-lo melhor e amar os Homens por amor a Deus. Este amor aumenta-se com oração e sacramentos. Quem mais ora, mais amor espiritual terá. Se não se dá esta dimensão espiritual, as outras dimensões caem.
P. Antonio Rivero
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por Zulmiro Sarmento, em 07.02.12
Todos sabem que Eduardo Lourenço, um dos grandes pensadores do nosso tempo e um dos melhores expoentes da nossa cultura, foi galardoado recentemente com o “Prémio Pessoa”. Não sendo propriamente um católico assumido, bem ao contrário, ouvi-o há tempos afirmar numa rádio, assumidamente, a seguinte mensagem que me permito redigir ao meu jeito: Até ao protestantismo do século XVI e ao racionalismo do século XIX, havia regras de vida, certezas de pensamento, esperança no futuro, consolação nas tristezas e força nas dificuldades. Tudo tinha sentido. Tudo estava explicado. Nesses tempos, os portugueses tiveram força para ir pelo mundo levar a Fé e construíram igrejas por todo o lado. O homem vivia mais sereno e mais feliz: tinha consigo as certezas da Fé… as verdades da religião…e a esperança da eternidade. Quando o racionalismo pôs em causa essas verdades, contestou esses dogmas e fez ruir essas certezas, retirou às pessoas as referências fundamentais e lançou a humanidade numa era de dúvida, de incerteza e de vazio. Pensando bem, que nos deram eles em troca? Nada! Agora, não há certezas…não há verdades…não há Deus…não há nada de verdadeiramente seguro e certo. Estamos condenados ao vazio, mergulhados na incerteza, e somos herdeiros da desesperança. A confirmar estas afirmações, veio um estudo recente dizer-nos que cerca de 25% dos portugueses, incluídos muitos que católicos praticantes, já não acreditam na vida para além da morte. À dúvida metódica dos filósofos, sucedeu depois a dúvida existencial do homem da cátedra e da pessoa da rua. A verdade porém é que, se nos falta esta visão do futuro e esta perspetiva do amanhã, ficamos sem horizonte no viver e sem esperança no morrer. Se perdemos a fé em Deus, Criador, Pai, Amigo e Redentor, e desprezamos a Sua Mensagem e a Sua presença em nossas vidas, ficamos à mercê das opiniões dos filósofos, vamos a reboque dos nossos efémeros instintos, e caminhamos na obediência às nossas pobres veleidades. Se entretanto falharmos na vida e precisarmos de alento e de perdão, quem nos virá ajudar? E quando a nossa saúde se esvair, as nossas vaidades se diluírem, e os nossos anos se aproximarem do fim, o que vai esperar cada um de nós? Uma personagem de Hemingway, perplexa, perguntava a um dado momento: “Agora que não há Deus, quem nos perdoará? Agora que não há Deus, quem nos vai salvar e acolher”? Nós que temos a graça de acreditar em Deus e nas verdades eternas, sabemos de quem viemos, para onde nos dirigimos e por onde devemos caminhar. Nós, os que continuamos a crer e a adorar, sabemos que Deus existe, que Deus nos vê, que Deus nos ama, que Deus nos ajuda, que Deus nos perdoa, que Deus nos espera, e que Deus nos irá acolher um dia como um Pai acolhe um filho que regressa a sua casa. Como nos sentimos bem assim! Para mim, as opiniões dos filósofos não passam de opiniões: só as acompanho por curiosidade intelectual. Ao contrário, as verdades da Fé são a minha certeza profunda, o meu arrimo reconfortante, e o penhor seguro do meu presente pleno de sentido, e do meu futuro cheio de esperança. Dou graças a Deus! E sinto-me bem assim!
Resende, 2 de Fevereiro de 2012
J. Correia Duarte
ECCLESIA
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