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D. António Braga, bispo de Angra do Heroísmo, face a um movimento de opinião no seio da Igreja diocesana, que levantou, mais uma vez, o problema da possível criação de uma nova diocese nos Açores, disse “olhar com sinceridade e tranquilidade para esta possibilidade”, acrescentando que “ este assunto não está a ser aprofundado… mas as pessoas têm direito à sua opinião e devemos discuti-la”. Num encontro sobre o tema, que decorreu na Matriz de Ponta Delgada, no âmbito dos “Diálogos sobre a fé”, intervieram, como oradores principais, o vigário geral da Diocese, o vigário episcopal da ilha de S. Miguel e leigos ligados à vida da Igreja.
Independentemente do resultado, esta iniciativa, vista pelo bispo diocesano de modo sereno e sensato, constitui um caminho novo para problemas importantes, senão mesmo urgentes da Igreja. Trazem, ao de cima, a necessidade de um espaço aberto de reflexão livre, sobre problemas que a Igreja enfrenta. Não são, muitas deles, apenas problemas do Papa, dos bispos e padres, mas de todo o Povo de Deus. Todos são protagonistas de uma história que lhes diz respeito, a que não se podem furtar impunemente e, em relação à qual, ninguém, legitimamente, os pode impedir de participar, mesmo na fase de reflexão. Não se trata de discussões de rua ou de procura de maiorias.
A preocupação de liberdade de opinião no seio da Igreja vem de Pio XII, que a viu de modo positivo. A lógica do Concílio Vaticano II reforçou, teoricamente, esta possibilidade e a importância de tal reflexão. Os órgãos de corresponsabilidade, então instituídos, apontam nesta linha. A experiência mostra, porém, que eles não são suficientes e que, muitas vezes, não exprimem o sentir legitimo das comunidades cristãs e dos leigos mais preparados para intervir, sem que tenham espaço para o poderem fazer.
Na Igreja não deve haver temas tabus. Há problemas, por si não discutíveis dada a sua natureza. Não são muitos, mas, mesmo assim, podem-se reflectir, de modo aberto, para melhor se compreenderem e comunicarem. Muitos problemas da Igreja, trazem consigo uma carga histórica, que os foi sedimentando e, por vezes, os tornou dogmáticos e intocáveis. Precisam, agora, de ser abanados e confrontados com novas situações sociais e culturais, que lhes dêem vida e os tornem mais actuais, ricos e expressivos.
Nas últimos décadas, assistimos a mudanças na Igreja: reforma da Semana Santa, jejum eucarístico, missas vespertinas, ministérios laicais, relações ecuménicas, leigos na Cúria Romana e nas cúrias diocesanas… Coisas que pareciam intocáveis, mas não o eram.
João Paulo II mandou que fosse repensada a teologia e a história do primado, porque não queria que ele fosse obstáculo à unidade dos cristãos. Há hoje situações em retrocesso. Passam-se à margem do Vaticano II e de uma sã tradição, faltando coragem para reflectir em voz alta e em clima de comunhão.
Os problemas da Igreja não se resolvem por votos de maiorias. Mas, respeitada a legítima decisão, a quem esta compete, não terão boa solução à margem do Povo de Deus, uma vez que os seus membros também participam do munus profético de Cristo e exprimem o “sentido da fé”, muito importante quando tomado a sério.
Neste sentido, com a atenção devida ao essencial, parece importante que se abram na Igreja espaços livres de opinião, com a preocupação de manter e promover a unidade da fé e a fidelidade ao Espírito, sempre em ordem à realização da missão comum
A atenção e a fidelidade aos sinais dos tempos, acolhidos, lidos e discernidos, obriga a mais comunhão na Igreja, para evitar visões unidimensionais e soluções pastorais inconsequentes. A reflexão e o confronto na Igreja, onde em muitas coisas, o opinável é enriquecedor, é caminho a estimular. Na Igreja não há problemas pastorais tabus. Se os houver, a sua acção empobrece, dia a dia, e o Povo de Deus valor. Não há melhor e mais rápida maneira de desinteressar, que impedir de falar ou ouvir, sempre e só, os mesmos.
Bispo António Marcelino
FICAR A VER NAVIOS.